Potentes difusoras de informação e opinião, as mídias sociais ganham também o planejamento estratégico e a rotina de veículos da mídia tradicional. Apesar deste peso crescente no mercado de notícias, o presidente-executivo da Associação Internacional de Mídia Jornalística (INMA, em inglês), o jornalista americano Earl Wilkinson, alerta: os editores precisam ser cuidadosos, pois “o amigo de hoje pode ser o inimigo de amanhã”. Em outras palavras, a relação entre redes sociais e jornalismo corre o risco de se esfacelar com o tempo.
O sinal amarelo, aceso também por especialistas e executivos da área, foi um dos pontos abordados no recém-encerrada conferência do INMA, em São Paulo. Ancorados por Wilkinson, os debates apontaram tanto vantagens quanto desvantagens da migração dos jornais para a internet. Um dos trunfos, observaram analistas, remete à credibilidade construída das versões em papel. Por outro lado, ainda é preciso identificar a “melhor forma de se obter receita com as publicações online, mesmo que não haja um modelo único para isso”, ponderou o diretor de jornalismo do Grupo Estado, João Caminoto.
A pergunta de um bilhão de dólares – como converter em lucro a crescente audiência online? – queima pestanas de antigos e novos barões da mídia há pelo menos uma década, diante da arrancada do consumo de informações nas plataformas digitais, sobretudo as móveis. Segundo o Centro de Pesquisas Pew, em Washington, o ano de 2015 foi “possivelmente o pior para os jornais americanos desde a Grande Recessão”. A circulação diária dos impressos caiu 7% em relação a 2010, enquanto a receita publicitária nas empresas jornalísticas diminuiu 8%. Nem a publicidade digital insinua-se suficiente para repor as perdas.
O cenário adverso, entretanto, é entendido por executivos como um possível ponto de virada. O diretor de redação da Folha de S.Paulo, Sérgio Dávila, acredita que parcerias com publicações especializadas sejam uma das estratégias ampliar a receita. Em entrevista, por e-mail, ao Jornal da PUC, Earl Wilkinson, aponta alguns outros caminhos. Ele também avalia as mudanças no jornalismo impresso provocadas pela inserção no meio digital e a relação entre jornais e redes sociais.
- Jornal da PUC: Que mudanças mais representativas, quanto ao jornalismo tradicional, decorrem da migração dos jornais para as plataformas digitais?
- Earl Wilkinson: Quando os jornais entraram na internet, eles simplesmente pegavam conteúdo produzido para o impresso e transferiam para a web. O leitor precisava pagar pela notícia no papel, mas o mesmo conteúdo estava disponível online gratuitamente. Hoje, ao olhar para trás, percebemos que isso foi um erro de proporções grandiosas.
- Por quê?
- Desde então, são feitos esforços a fim de diferenciar a produção para os dois meios. Esses esforços passam, por exemplo, pela forma como as manchetes são escritas no impresso e readaptadas para o formato online. Editores experientes ainda estão experimentando estratégias e sempre chegam a novas conclusões. Acredito, de maneira geral, que o digital é melhor para as notícias imediatas, enquanto o impresso encaixa com o aprofundamento dos fatos. Isso explica o porquê de os jornais no papel obterem sucesso nos fins de semana, quando as pessoas têm mais tempo para ler.
- Como as redes sociais podem ser aproveitadas pelos jornais impressos? Quais desafios trazidos por elas?
- A mídia social pode, ao mesmo tempo, ser uma plataforma promocional e distribuidora. Aprendemos, no entanto, que o encorajamento para uso do digital existente hoje em dia pode mudar, assim como os algoritmos e as prioridades das redes sociais também mudam. Por causa disso, recomendo aos editores serem maleáveis quando tratarem de mídia social. O amigo de hoje talvez seja o inimigo de amanhã.
- O senhor observou, no primeiro dia da Conferência 2016 da Associação Internacional de Mídia Jornalística, que os veículos nascidos na internet enfrentam dificuldades como a perda de audiência e de receitas publicitárias. Os jornais impressos que migraram para o meio digital têm mais facilidade com essas questões?
- Os veículos nascidos na web partiram de uma base publicitária baixa, porque não recebiam investimentos. Com isso, fica mais fácil obter um crescimento inicial. Qualquer dinheiro que entrasse, já faria crescer a receita. No entanto, conforme o tempo passou, a atração de capital diminuiu, ficando abaixo do nível consolidado anteriormente pelos jornais impressos. A questão, portanto, não é uma maior facilidade dos meios tradicionais, mas sim a reputação que mantêm no mercado publicitário.
- As receitas de publicidade dos jornais impressos, em média, também caíram nos últimos anos. Quais podem ser as soluções para retomar ou, ao menos, atenuar as perdas?
- A publicidade nunca mais será a mesma. Tudo está baseado nas métricas (valor cobrado pelos jornais para anunciar marcas em determinado espaço das páginas) e na experiência de negociação, que determinam quanto os veículos jornalísticos lucram com os anúncios. Por via contrária, muito dinheiro também vai sair da mídia, até mesmo em estratégias próprias de divulgação. Enquanto os jornais impressos continuarem com declínio de receita, os editores precisarão entender o baú de opções que podem surgir, como ideias criativas para diferenciar os veículos e a segmentação deles.