Democracia em Risco
06/05/2019 18:42
Ana Carolina Moraes

Professor da Universidade Johns Hopkins discute em palestra o populismo no século XXI

O professor Yascha Mounk ministrou palestra sobre o crescimento do populismo. Foto: Larissa Gomes

A ideia de que democracia e liberalismo são elementos inseparáveis é um engano. Este foi um dos argumentos do professor Yascha Mounk, da Universidade Johns Hopkins, Estados Unidos, na palestra que ministrou no dia 26 de abril. A apresentação, segunda do ciclo Populismo e Democracia, foi baseada no livro do cientista político O Povo Contra a Democracia (2018), recém traduzido para o português. O professor falou sobre as características do populismo, além de listar os fatores que levaram ao aumento da popularidade deste tipo de governo.

PhD em ciências políticas pela Universidade de Harvard, Mounk explicou que o populista convence o povo de que ele é a única figura capaz de representar a nação, já que os outros políticos são subordinados a uma classe da população e devem ser afastados. Qualquer um que discorde dos populistas, como partidos da oposição, jornais e instituições independentes, é automaticamente ilegítimo, explicou o professor.

Mounk disse que a primeira coisa que o político faz, quando assume, é atacar o aspecto liberal da democracia, retirando os direitos das minorias, sejam elas religiosas, étnicas, sexuais ou intelectuais. Em seguida, ele ressaltou que é comum que esses governantes favoreçam politicamente os aliados.

- Em um segundo momento, o populista coloca pessoas leais a ele em cargos políticos, e é aí que a noção da democracia em si começa a ser ameaçada. Quando não há mais liberdade de imprensa e instituições independentes, quando os cargos políticos são ocupados por pessoas determinadas pelo governo, se torna impossível retirar do poder de forma democrática um governante que foi eleito democraticamente.

Em relação às causas do populismo, o cientista político citou a estagnação da economia, ou a falta de crença de uma economia justa, como um dos fatores. Em países como o Brasil, explicou, apesar de ter havido um certo crescimento econômico, a corrupção faz com que grande parte dos cidadãos fiquem insatisfeitos. Isso porque acreditam que não estão tão bem economicamente quanto poderiam, caso a renda fosse dividida de forma justa. De acordo com o professor, o segundo fator para a popularidade do populismo são as rápidas mudanças culturais e demográficas pelas quais muitos países passaram nos últimos 50 anos.

O auditório do RDC durante palestra do professor Mounk. Foto: Larissa Gomes

Mounk é alemão e filho de poloneses. Ele relatou que, durante sua infância, as únicas formas de se tornar um cidadão alemão eram por parentesco ou por casamento. Hoje, afirmou, é possível um imigrante obter a cidadania de forma legal depois de cumprir certos requisitos. O cientista político, porém, comentou que uma parcela da população é resistente a essas mudanças porque a frágil posição delas no topo da hierarquia social está ameaçada. Em relação ao termo patriotismo, o professor comentou ter mudado de opinião ao longo da vida, fato que o fez criar o termo patriotismo inclusivo.

- Acredito que entregamos a noção do nacionalismo e dos seus símbolos a pessoas que querem usá-la para excluir as minorias, e isso foi um erro. Não existe país no mundo onde não há um sentimento nacionalista. Ele também foi o fator que nos permitiu expandir o círculo da humanidade para além da nossa própria família. O patriotismo inclusivo significa que deve haver um espaço igual para todos que habitam um país.

O último ingrediente que compõe o coquetel explosivo do populismo, citado pelo professor, é o crescimento da internet e das redes sociais. Ele explicou que, como seres humanos são influenciáveis e tendem a agradar, em grupos sociais mistos, a taxa de radicalismo é baixa. O professor acredita que por causa da organização das redes sociais, o usuário acaba em uma câmara de eco ideológica que favorece a autorradicalização. O alcance que as publicações on-line podem ter é outro fator delicado para o professor.

- Estamos em um mundo onde a comunicação ocorre de muitos para muitos. Não é mais necessário ter acesso ao capital e ser dono de um veículo tradicional. Qualquer pessoa com 30 ou 50 amigos no Facebook tem a capacidade de alcançar milhões se postar algo particularmente impressionante. Isso permite que grupos marginalizados da população possam ter uma voz, mas também facilita a propagação do ódio, de mentiras e a organização de grupos extremistas.

O professor Arthur Ituassu (esquerda) foi o responsável pela abertura da palestra. Foto: Larissa Gomes

Ao ser questionado sobre a força do populismo, o professor disse que não tem como afirmar, mas que acredita que seja o começo de uma nova era na política. Como as razões listadas por ele para o crescimento da popularidade deste tipo de governo são estruturais a longo prazo, Mounk comentou que elas não devem ser erradicadas repentinamente. Um processo que ele afirmou se repetir em vários países é a substituição de um governante populista pelo sucessor, o que perpetua essa forma de governo.

- O que acontece com frequência é que o povo entrega a confiança apenas para o próximo populista na fila de políticos, que pode ser até mais extremista do que o anterior. Então, acredito que é impossível determinar se estamos vivendo um momento populista ou uma era populista que vai durar pela maior parte da nossa vida adulta, mas acredito que há boa razão para acreditar que é a segunda opção.

A esperança para que isso não ocorra, para Mounk, está nos conceitos de liberdade e de autodeterminação coletiva. O primeiro garante que cada um pode ser livre para viver a vida privada da forma que preferir, e o segundo afirma que o povo deve tomar as decisões políticas em vez de ter uma figura como um monarca, religioso ou ditador decidir por eles.  Ele ressaltou que o liberalismo e a democracia são elementos que podem ser separados e que, se os tornarmos sinônimos, fica difícil de pensar claramente sobre a natureza e a tensão entre eles.

- Apesar de realmente estar preocupado com a popularidade dos governos populistas ao redor do mundo, estou convencido de que os ideais de liberdade e de autodeterminação coletiva são tão relevantes e populares quanto foram um dia, o que me dá esperança de que o populismo seja de fato uma onda passageira.

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