Inclusão Digital supera obstáculos gerados pela pandemia
12/11/2020 18:26
Letícia Messias

Objetivo é promover o acesso a computadores e pacotes de dados para alunos da PUC-Rio em situação de vulnerabilidade socioeconômica

Cerca de 480 alunos serão atendidos, seja com computador, pacote de dados ou ambos. Foto: Acervo pessoal

O impacto da migração dos estudos para o ambiente virtual foi significativo, especialmente para alunos com limitações de equipamento para acompanhar o ensino remoto. Para contornar as dificuldades apresentadas, a PUC-Rio criou a campanha de Inclusão Digital, um fundo de apoio aos estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica para que eles possam ter acesso a computadores e pacote de dados. Em outubro, o projeto distribuiu 278 máquinas, 199 básicas e 79 mais avançadas para cursos específicos, além de 275 chips para acesso à Internet.

A iniciativa foi apresentada pelos vice-decanos do Centro Técnico Científico (CTC), Centro de Ciências Sociais (CCS), Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH) e Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) e apoiada pela Vice-Reitoria Comunitária (VRC). Segundo o Vice-Decano Setorial de Desenvolvimento do CTC, professor Sidnei Paciornik, ao todo, cerca 480 alunos serão atendidos, seja com fornecimento de computador, pacote de dados ou ambos. Ele destaca que o processo de elaboração da campanha foi demorado e envolveu muito aprendizado até que fosse possível chegar aos estudantes com a proposta pronta.

— Inicialmente, fizemos um mapeamento das necessidades dos alunos. Mandamos um questionário perguntando quais eram as dificuldades técnicas que eles tinham. Cerca de 1/3 respondeu, e isso deu uma boa base para entender onde estavam as restrições. Alguns não tinham computador ou precisavam compartilhar e não tinham acesso à Internet de qualidade. Tivemos cerca de 540 inscrições, algumas invalidadas por questões de renda, e chegamos a um número final de cerca de 480 alunos qualificados para receber o auxílio.

De acordo com Paciornik, paralelamente a este processo, foi necessário iniciar a captação de recursos. A campanha foi divulgada no site da PUC-Rio e em redes sociais e recebeu contribuição da Associação dos Antigos Alunos, além de doações de  professores e estudantes. Segundo ele, desde o início, em julho, foram arrecadados cerca de R$ 560 mil. Os equipamentos são alugados por um ano, com possibilidade de renovação. Para o professor, a necessidade transcende o período da pandemia, e a ideia é que a campanha permaneça.

— Sabemos que muitos alunos tinham dificuldade de qualquer jeito, independentemente da necessidade de assistir às aulas on-line. Temos a intenção de manter editais regulares para o atendimento de alunos mais carentes. A ideia é contar com o apoio do fundo de Endowment desenvolvido pela Associação de Antigos Alunos e submeter projetos para que o movimento de Inclusão Digital se torne permanente, de modo que estudantes sempre possam ser atendidos na necessidade de computador e Internet, que, afinal, são absolutamente cotidianos hoje em dia.

 A estudante Gabriela Paiva recebeu o equipamento. Foto: Acervo pessoal 

O estudante do 6º período de Psicologia Douglas Vidal foi um dos alunos que receberam o equipamento. Segundo ele, a Covid-19 é um lembrete de como o acesso à educação é afetado pela desigualdade. Sem um computador que pudesse suportar as atividades acadêmicas, Vidal ainda enfrentou problemas com os cabos de rede da comunidade onde mora, pois eram roubados semanalmente. Para ele, a iniciativa da Universidade é fundamental para manter estudantes de baixa renda no ensino superior.

—  Como bolsista PROUNI, a faculdade é uma importante ferramenta para melhorar a vida da minha família no futuro. No entanto, a pandemia chegou para me lembrar o quanto a realidade era um empecilho para os estudos. Semanalmente roubam os cabos de rede da minha comunidade, fazendo com que acompanhar as aulas não chegasse nem perto de ser uma possibilidade. Admito que fiquei surpreso ao entregarem em casa o equipamento. Os envolvidos no programa estão de parabéns. Eles mudaram a vida de muitas pessoas durante a pandemia, e nos ajudaram a manter nosso sonho vivo.

A estudante do 8º período de publicidade Gabriela Paiva também recebeu o equipamento. Segundo ela, a pandemia afetou não só o lado acadêmico, mas também o emocional. Além de precisar usar o celular em meio ao processo de elaboração do trabalho de conclusão de curso no primeiro semestre do ano, Gabriela conta que sofreu uma perda familiar durante a pandemia. Ela afirma que, apesar disso, não chegou a pensar em trancar a faculdade, e encontrou motivação na história da própria família.

— Tive conhecimento da campanha por meio do diálogo que ocorre entre a instituição e os alunos no e-mail. O projeto foi muito importante, não só para mim, mas para que muitos universitários permanecessem com seus estudos. Não adianta apenas colocar negros e periféricos na Universidade, é preciso oferecer recursos para que esses concluam o curso. Avalio a iniciativa como algo muito nobre para a construção de um país menos desigual.

 

Em outubro, o projeto distribuiu 278 máquinas e 275 chips para acesso à internet. Foto: Maria Clara Frnandes. 

Segundo o Vice-Reitor Comunitário, professor Augusto Sampaio, para evitar que os alunos, ao se deslocarem até o campus da Gávea, fossem expostos e corressem o risco de uma contaminação, as entregas foram feitas nos locais onde eles vivem. De acordo com Sampaio, a PUC-Rio sempre foi vista pela sociedade carioca como uma instituição de ensino superior para classe média alta. A partir da década de 1990, no entanto, foi implantado o programa de Bolsas de Ação Social, destinado a pessoas com perfil filantrópico, e cerca de 1.200 estudantes foram atendidos. Além disso, a Universidade também criou o Fundo Emergencial de Solidariedade da PUC (FESP) para oferecer transporte e alimentação. Para ele, a campanha de Inclusão Digital surge como mais uma forma de manter o compromisso com a inclusão. 

— A gratuidade não garante que uma pessoa possa cursar o ensino superior, e a pandemia surge como um novo obstáculo. Como um jovem que mora na periferia, sem computador ou Internet, vai acompanhar a aula? A missão de ensinar remotamente, agora, está cumprida. No contexto atual, se não tivermos uma máquina, não podemos fazer nada. Uma vez que temos o compromisso de inclusão, em todas as esferas, a inclusão digital se torna mais uma campanha indispensável.

 

 Para evitar a exposição dos alunos, a maior parte dos equipamentos foram entregues em domicílio. 

A aluna do 5º período de Cinema Maria Clara Fernandes recebeu um computador e o pacote de dados para dar continuidade aos estudos. De acordo com ela, o curso exige uma demanda de trabalhos que ela não conseguia corresponder no primeiro semestre. Com um notebook emprestado de uma amiga, pôde acompanhar as aulas, mas não havia programas de edição para fazer atividades mais práticas. Neste cenário, ela avalia a ação da Universidade como um mecanismo essencial para que alunos de baixa renda tenham as mesmas oportunidades.

— Este projeto tem contribuído muito para a manutenção dos meus estudos. A falta de um bom equipamento pesou durante o primeiro semestre. Como curso Cinema, muitas matérias pedem vídeos, e meu notebook não suportava programas de edição, então tive que conversar com os professores para fazer trabalhos escritos ou com fotos. Eles foram compreensivos, e a dificuldade técnica não impactou minha nota, mas senti muita falta da prática. Agora, com esse auxílio, as coisas estão bem mais fáceis.

Sampaio indica a possibilidade de continuação do projeto. Segundo ele, serão criadas regras e adaptações para um cenário pós-pandemia. Ele ressalta que a função da Vice Reitoria Comunitária é acolher o aluno, seja para demandas, reclamações ou esclarecimentos. Além disso, o professor afirma que o momento atual permitiu a reflexão sobre diversas esferas que podem ser aprimoradas, e que a PUC-Rio estará atenta para adaptar o que for necessário.

— É a partir da contestação da realidade que nós tomamos uma providência. A pandemia é um desafio, e não sabemos como será no próximo ano, mas um jovem pobre, que recebeu o computador, ainda precisará dele após a pandemia. Cada vez mais isto será uma ferramenta fundamental. Tudo o que aconteceu nos ensina muita coisa e, talvez, as pessoas comecem a reavaliar a falta de um computador para uma pessoa pobre. A situação faz com que a consciência fique mais aguçada. No presencial, a pessoa tem o transporte e alimentação. Com a distância, deve haver a inclusão digital.

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