Mais do que esposas, elas são primeiras-damas
19/11/2008 17:30
Aline Veloso e Gabriela Pacheco / Ilustrações: Diogo Maduell

Seus maridos são eleitos e elas assumem uma posição de destaque: serem as primeiras-damas. Sem função obrigatória oficial, elas precisam encontrar seus espaços como esposas dos homens encarregados de um país. De ações sociais a criação de novas políticas, o papel desempenhado por cada uma delas está diretamente relacionado à sua personalidade. Ao conhecer um pouco das trajetórias das primeiras-damas ao redor do mundo, dos Estados Unidos a Dubai, é possível perceber as diferentes expectativas que cada população tem da companheira do governante. No marketing político, a visão sobre a esposa do candidato ainda não passa da função de mostrar uma boa estrutura familiar, diz o professor João Renha, do Departamento de Comunicação Social, que já participou de várias campanhas políticas. 

As "Donas" dos presidentes

 

As primeiras-damas não têm função oficial, mas também não são apenas as mulheres dos políticos. Independentemente de quantos assessores os governantes tenham, elas se fazem ouvir, nem que seja com os comentários ao pé do ouvido. Durante quatro e possivelmente oito anos, elas também podem desempenhar um papel significativo no futuro de um país, no entanto, pouco se sabe sobre essas mulheres, que têm um grande e discreto poder de influência.

 

Desde 2003, Marisa Letícia Rocco Casa é a primeira-dama da nação brasileira, e atua na Organização Não-Governamental Ação Fome Zero. De acordo com a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto, a 35ª primeira-dama do Brasil trabalha em prol da segurança alimentar e nutricional da população carente do país como presidente de honra. Segue, assim, a postura tradicional das primeiras-damas, que usam de sua influência para apoiar projetos sociais.

 

Para o professor da disciplina Imprensa e as Eleições Presidenciais no Brasil, César Romero Jacob, do Departamento de Comunicação Social, é preciso diferenciar as duas posturas da companheira de um político: no curso da campanha e ao longo do mandato.

 

– Como candidata a primeira-dama, a mulher é favorável na formação da imagem de uma família bem constituída. Provavelmente por esse motivo, por estratégia política, Dona Marisa saiu das sombras para se apresentar na vida pública ao lado do presidente Lula, nas campanhas de 2002, afirma Romero.

 

A presença de Dona Marisa na campanha eleitoral de 2002 contrastou com sua ausência nas tentativas anteriores (1989, 94 e 98), em que ataques à vida pessoal de Lula prejudicaram a imagem dele. A pouca exposição do casal, já que Marisa se ausentou temporariamente para cuidar dos filhos pequenos, dificultou a construção de um perfil familiar, porque as pessoas desconheciam o motivo de suas ausências.

 

– O marketing político brasileiro, de forma geral, ainda é muito machista, pois as companheiras aparecem apenas como esposas e não como cabeças pensantes. Acredito que a postura está mudando aos poucos. Elas estão deixando de ficar à sombra dos maridos para estar ao lado deles, arrisca João Renha, professor de Técnicas de Comunicação II.

 

Renha, que realizou campanhas políticas em diversos estados do país, afirma que é uma pena que o papel da primeira-dama não seja melhor analisado pelo marketing político e mais questionado pela população, pois serão elas as principais conselheiras dos governantes.

 

No final dos anos 70, Marisa era militante ativa e incentivava a participação sindical das mulheres no ABCD paulista. Em 10 de fevereiro de 1980, quando é fundado o Partido dos Trabalhadores (PT), foi Marisa quem cortou e costurou a primeira bandeira vermelha. Logo após a intervenção do governo federal e conseqüente prisão de Lula, foi ela quem organizou a passeata de mulheres pela libertação dos sindicalistas.

 

A trajetória pró-ativa da primeira-dama foi retomada em 2002, com os filhos já adultos. Marisa assumiu o posto da socióloga Ruth Cardoso. Formada na Universidade de São Paulo (USP), PhD em Antropologia, Ruth foi professora na Maison des Sciences de L’Homme, em Paris, e nas universidades de Berkeley e Colúmbia, nos Estados Unidos. Era de conhecimento geral que Dona Ruth não gostava de ser chamada de primeira-dama, pois alegava que o tratamento era uma cópia do utilizado pelos norte-americanos.

 

Mais de cinco milhões de pessoas foram alfabetizadas e outras centenas de milhares se qualificaram profissionalmente devido ao trabalho da organização da sociedade civil Comunidade Solidária, criada no primeiro ano do governo Fernando Henrique Cardoso, hoje transformada na ONG Comunitas. Presidente do Conselho, Ruth criou programas humanitários que favoreceram os municípios mais pobres do país, que recebem verbas oficiais, por exemplo, de merenda escolar e cestas básicas.

 

Outras primeiras-damas que se sobressaíram de alguma maneira, foram Dona Darcy Vargas, Dona Sarah Kubitscheck e a bela Dona Maria Tereza Goulart. A companheira do presidente Getúlio Vargas fundou a Legião Brasileira de Assistência, que combateu nacionalmente a desnutrição infantil. A parceira de Juscelino Kubitscheck atuou em ações sociais do governo, além de providenciar o almoço em marmita para o marido e enviá-lo ao Palácio do Catete. João Goulart foi o marido da primeira-dama mais bonita da história do país, que inspirou até mesmo uma lenda segundo a qual a primeira-dama norte-americana Jaqueline Kennedy, símbolo de beleza, tinha ciúmes da brasileira nos compromissos internacionais.

 

No âmbito estadual, a ênfase da mídia dada à primeira-dama é mais restrita que a presidencial. No caso do Estado do Rio de Janeiro, a primeira-dama é a advogada Adriana Ancelmo, esposa do governador Sérgio Cabral Filho. Ela é presidente de honra da obra social do Rio de Janeiro, a ONG RioSolidário, que atende adolescentes em conflito com a lei, mulheres e crianças vítimas de violência doméstica, jovens grávidas e idosos. Ex-aluna da PUC-Rio, Adriana também exerce sua função como advogada e sócia no escritório Coelho, Ancelmo & Dourado e é mãe de dois filhos.

 

Foi ela quem optou por não ocupar a residência oficial no Palácio das Laranjeiras, alegando não misturar a vida política com a pessoal. Sua influência vai além: Adriana presenciou as péssimas condições das instituições para menores infratores e relatou tudo ao marido. Cabral atendeu à primeira-dama e reformou as unidades.

 

O posto de primeira-dama da cidade do Rio de Janeiro está prestes a ser ocupado. Cristine Assed Paes, casada com o prefeito eleito Eduardo Paes, não participou ativamente das etapas da campanha eleitoral. A engenheira eletricista, em entrevista ao jornal O Dia, disse que não gosta de tratar de política em casa. Para ela, os filhos já têm pouco tempo com o pai para ainda terem que presenciar essas discussões. Como primeira-dama, porém, ela pretende participar de projetos de educação infantil, de apoios a gestantes e cuidados com os idosos.

 

 

 Jaqueline Kennedy

Jacqueline Lee Bouvier Kennedy Onassis foi uma representante da alta sociedade americana. Nenhuma mulher teve tantas biografias, mais de vinte. Jackie O, como ficou conhecida, tornou-se a musa da Casa Branca por três anos, entre 1961 e 63, ao lado de John F. Kennedy. Testemunhou o assassinato do marido, mas mesmo se casando cinco anos depois com Aristóteles Onassis, manteve a imagem da eterna viúva presidencial. Com a morte do magnata grego, viveu ao lado do milionário belga Maurice Tempelsman.  Jackie Kennedy é lembrada pelo seu bom gosto ao se vestir e elegância. Morreu aos 64 anos devido a um câncer linfático.

 

 Michelle Obama

No dia 20 de janeiro de 2009, Michelle LaVaughn Robinson Obama será a primeira primeira-dama negra da história dos Estados Unidos. Mulher de Barack Obama, presidente mais votado da história do país, há dezesseis anos e mãe de duas filhas, Michelle é formada em Direito pela Universidade de Harvard. Advogada de famílias pobres, ela seguiu o mesmo percurso profissional de Obama. A 40ª primeira-dama norte-americana participou ativamente da campanha eleitoral do marido, contrastando com a discrição de Laura Bush. Michelle discursou em comícios sozinha e acompanhou com as filhas o candidato à presidência, construindo um forte perfil familiar dos Obama.

 

 Imelda Marcos

A viúva do ex-presidente ditador filipino Ferdinand Marcos (1965-86), Imelda Marcos, ficou conhecida pelos 1.200 pares de sapatos que tinha. A coleção de calçados foi encontrada no palácio presidencial após a fuga do casal devido a uma revolta popular. Em 1991, Imelda retorna do exílio e consegue manter o status na vida social do país, absolvida das suspeitas de acumular US$ 10 bilhões ilicitamente pela Comissão Presidencial para o Bom Governo das Filipinas. A coleção, de tão impressionante, virou museu: o Museu de Calçados da Cidade de Marikina foi aberto pela própria Imelda, em 2001, na cidade sede da indústria de calçados filipina. Mais de 400 pessoas visitam o local todo mês. De acordo com sua porta-voz, a atual coleção chega a cinco mil pares, grande parte, presentes de admiradores.

 

 Cristina Kirchner

Atual presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner sucede seu marido, Nestor Kirchner. A ex-primeira-dama é a primeira mulher eleita a ocupar o cargo executivo do país. Ex-militantes do peronismo, o casal se conheceu na Faculdade de Direito da Universidade Nacional de La Plata, em Buenos Aires, Argentina. À frente da Comissão de Assuntos Constitucionais do Senado, Cristina foi uma primeira-dama tão atuante que venceu as eleições de 2007 com mais votos que seu marido, em 2003. Com ações políticas comuns ao modelo Kirchner, a popularidade de Cristina cai a cada ano.

 

 Evita Perón

O carisma de Maria Eva Duarte a transformou na primeira-dama argentina presente até hoje no imaginário popular. Centro do poder peronista, Evita mantinha sua popularidade junto aos sindicalistas e às massas trabalhadoras. Em 1944, conheceu o coronel Juan Domingo Perón e, dois anos mais tarde, casaram-se. No papel de primeira-dama, Eva participou tanto no aspecto político quanto no social. Trabalhou para obter o voto feminino e desenvolveu a Fundação Eva Perón. Aos 33 anos, morreu de câncer. Seu corpo foi embalsamado e o velório durou quatorze dias. Após a queda de Perón, seus opositores sequestraram os restos mortais para que o túmulo não se transformasse em local de culto. Até 1971, ele ficou enterrado sob um falso nome em um cemitério em Milão, na Itália. Depois da morte de Perón, sua terceira mulher, Isabelita, trouxe os restos mortais de Evita para Buenos Aires.  

 

 Carla Bruni

Cantora, compositora, modelo e atual primeira-dama da França, Carla Gilberta Bruni Tedeschi Sarkozy nasceu em 1967, em Turim, Itália. Em 73, mudou-se com a família para Paris. Entrou para a Universidade de Sorbonne, mas abandonou os estudos para seguir a carreira de modelo, na qual foi bem sucedida. Carla já teve supostas ligações românticas como Mick Jagger,  Eric Clapton  e Donald Trump. Em dezembro de 2007, surgiram rumores na imprensa francesa sobre o namoro com o presidente Nicolas Sarkozy. Em  fevereiro de 2008, casaram-se. Lançou seu terceiro disco em julho e co-escreveu doze das quatorze músicas. Ela pretende doar parte dos direitos autorais para causas humanitárias. A história do casal virou  livro, La Véritable Histoire de Carla et Nicolas.  

 

 Marisabel Rodíguez

Segunda ex-mulher de Hugo Chávez, Marisabel deixou o posto de primeira-dama em 2002, e, desde então, já provou que a separação não foi amigável e se posicionou contra a reeleição indefinida do presidente. A ex-primeira-dama foi um dos 131 membros da Assembléia Nacional Constituinte, em 1999. Atualmente, aos 41 anos, ela é candidata à prefeitura de Barquisimeto, nas eleições de 23 de novembro, e faz críticas ao governo venezuelano. Em maio, afirmou que era vítima de perseguição por parte de Chávez. 

 

 Svetlana Medvedev

O presidente russo Dimitri Medvedev tem a seu lado a primeira-dama Svetlana, que o incentiva a promover o otimismo no futuro da Rússia. A primeira-dama teve a idéia de celebrar o Dia da Família, Amor e Fidelidade, feriado do governo para tentar amenizar o problema de queda no crescimento populacional.

 

 

 Graça Machel

Primeira-dama de presidentes diferentes, em países distintos. Na história de Graça Machel dois homens marcantes: os presidentes Samora Machel, de Moçambique, e Nelson Mandela, da África do Sul. Em 1975, tornou-se ministra da Educação e Cultura de Moçambique, e até sua renúncia do cargo, em 89, a porcentagem de crianças matriculadas no primário dobrou. Com a morte de Manchel, em 86, em um acidente de avião, Graça teve que criar sozinha seus três filhos. Ela foi presidente da comissão nacional da Unesco em Moçambique e produziu o relatório sobre o impacto dos conflitos armados em crianças para a ONU, em 94.  A terceira esposa de Mandela continua ativa na presidência da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade.

 

 Haya Bint Al Hussein

A Embaixada dos Emirados Árabes Unidos não soube informar sobre a primeira-dama do país, nem ao menos seu nome. Por outro lado, a primeira-dama do emirado de Dubai destaca-se na região. A princesa Haya Bint Al Hussein, da Jordânia, casou-se em 2004 com o xeque Mohammed bin Rashid Al Maktoum, vice-presidente e primeiro-ministro de Dubai. Mensageira da paz da ONU, Haya foi a primeira árabe e a primeira mulher a ocupar o cargo de Embaixadora da Boa Vontade do Programa Alimentar Mundial da ONU, de 2005 a 2007. Primeira mulher árabe a competir nas Olimpíadas, Haya tornou-se presidente da Federação Eqüestre Internacional.  Entre os anos de 1995 e 2002, a princesa participou de 39 competições mundiais por ano.

 

 Liu Yongqing

A atual primeira-dama da China conheceu Hu Jintao na prestigiada Universidade de Tsinghua, em Pequim. Como manda a tradição chinesa, pouco se pronuncia e participa da vida política do marido.

 

Edição 210

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