Uma imortal entre nós
18/09/2024 11:31
Thaís Helena Andrade

Escritora Rosiska Darcy de Oliveira divulga a Revista Brasileira da ABL

Rosiska Darcy de Oliveira e Cristina Aragão. (Foto: Matheus Santos)

A escritora e ensaísta carioca Rosiska Darcy de Oliveira, ocupante da Cadeira 10 na Academia Brasileira de Letras (ABL) e editora da Revista Brasileira da ABL, esteve na PUC-Rio acompanhada pela jornalista e editora-adjunta, Cristina Aragão, para divulgar o periódico que edita e conversar com estudantes do curso de Jornalismo organizados pela Profª Rose Esquenazi, do Departamento de Comunicação. 

Em sala de aula situada no prédio do Rio DataCentro - RDC, a acadêmica contou um pouco da sua trajetória acadêmica e profissional até os dias atuais, relembrando o período de exílio político vivido durante a Ditadura Militar e revelando que é ex-aluna da PUC-Rio e ex-Professora do Departamento de Letras. 

- Eu sou ex-PUC: ex-aluna da PUC e professora do Doutorado de Letras durante muitos anos. Me formei em Direito e comecei a trabalhar como jornalista, pois na minha geração era assim que se fazia. Estavam começando os cursos de jornalismo e a maioria [dos jornalistas] eram pessoas que vinham de outras carreiras. Eu comecei a trabalhar na Revista Senhor, fechada em 1964 com o início da Ditadura Militar. [...] Logo depois, trabalhei no Jornal do Brasil. Em seguida, fui para o exterior em decorrência do exílio. Fui acusada, com razão, de ter denunciado as torturas no Brasil junto à imprensa internacional.

Sobre o exercício da profissão de jornalista em tempos de Ditadura Militar, Rosiska lembrou que trabalhou com pseudônimos durante o tempo que passou exilada em Genebra, na Suíça:

- Eu era correspondente da Revista Isto É, tinha uma carteira na ONU para fazer cobertura, e mandei várias matérias com pseudônimo. Eu trabalhava com pseudônimo, pois não podia assinar meu nome. O trabalho foi todo junto à Comissão Internacional de Direitos Humanos porque a situação do Brasil era, naquela época, insuportável.

Em Genebra e longe da língua materna, Rosiska passou a trabalhar com o educador Paulo Freire, redirecionando o seu trabalho para o campo da educação. “Ele começou a trabalhar com alfabetização de camponeses e criou toda uma filosofia da educação que partia da realidade das pessoas”, ela conta.

Rosiska Darcy de Oliveira. (Foto: Matheus Santos)

Como escritora e ensaísta, Rosiska Darcy explicou aos alunos que se descobriu na carreira após retornar do exílio e participar do movimento feminista. Ela revelou que enxergou na experiência social uma possibilidade de mudança na educação, se dedicando à atividade ensaística sobre os temas da educação e do feminino desde então. 

- Quando voltei ao Brasil, trouxe comigo uma experiência que foi absolutamente fundamental, que foi o encontro com o movimento de mulheres, que estava sendo fundado naquele momento. Isso foi importantíssimo na minha vida, me abriu uma visão de mundo que eu não tinha antes. Uma coisa fundamental que eu aprendi é que um movimento social, uma experiência desse tipo podia ser uma experiência educativa sem preço, formidável. Escrevi, inclusive, um livro sobre isso, sobre como um movimento social muda a educação. Disso tudo, me descobri, na verdade, uma escritora.

O livro mencionado por Rosiska se chama Elogio da Diferença e foi publicado no Brasil pela Editora Brasiliense em 1991, e nos EUA pela Editora Rutgers em 1998.

Como é sabido, os membros da ABL são popularmente conhecidos como ‘Imortais’, dada a relevância literária e linguística de sua obra para o Brasil, que se prolonga no tempo. Por ocuparem cadeiras vitalícias na instituição, os membros mantêm o vínculo acadêmico até o final da vida. Rosiska, no entanto, brinca com a denominação de imortal, ressaltando que a imortalidade é da obra, e não do autor:

- A ideia da imortalidade não é da pessoa, mas sim da obra. Como a ABL é uma instituição que cultua a memória, o que é bom num país sem memória? Num país que tem pouca dimensão histórica? Escritores que marcaram uma geração, muitas vezes, são completamente esquecidos por outra, apesar da importante contribuição literária que deram. Então a ABL cultua essa memória. [...] É um culto da memória importante, o que vai dando uma certa imortalidade, se é que é possível utilizar essa expressão. Pelo menos uma certa longevidade. [...] Essa palavra se refere à obra, mas acabou colando nas pessoas. E ai de quem acreditar nisso. Não é o meu caso: eu não acredito e por isso disse que sou feminista e mortal.

Rosiska Darcy de Oliveira. (Foto: Matheus Santos)

Sobre a Revista Brasileira da ABL, Rosiska Darcy de Oliveira ressaltou que se trata de uma revista centenária que ficou afastada dos tempos contemporâneos, circulando apenas em meios acadêmicos. Ao assumir a editoria da revista, a acadêmica implementou uma reforma gráfica e de conteúdo. O objetivo foi traduzir uma nova visão de Academia “de portas abertas” para a sociedade, como resultado das renovações e redefinições implementadas nos últimos anos, mas sem esquecer de seu passado. 

- Mudou a Academia, a revista, as ideias, as pessoas, mas continua um princípio: não se esquecer do que foi vivido. O passado existe e o passado construiu muita coisa. É a história do Brasil", concluiu. 

É por isso que Rosiska destaca que, hoje, a Revista Brasileira busca tratar de temas que interessam ao país e que são problemáticos, precisando de discussão. “A gente traz aqui e convida as pessoas que trabalham o tema, que são mais competentes, para escreverem sobre ele”, ela disse. 

As fake news, por exemplo, são apontadas pela acadêmica como uma realidade paralela, inventada e problemática, que merece entrar na pauta do periódico, dado o desafio que representa.

- Começou como uma espécie de contra-informação. Uma realidade paralela, inventada, criada a serviço de determinadas causas e pessoas ou contra determinadas pessoas. O que me apavora no fenômeno das fake news são duas coisas: primeiro, a incrível facilidade com que elas são difundidas, como é rápida a sua difusão. E segundo, o elemento de censura que ela representa. Você escreve uma notícia sobre um fato que você presenciou como jornalista, você diz que aquilo aconteceu e aparece uma notícia mais poderosa que a sua dizendo que aquilo não aconteceu. E isso é repetido incansavelmente [...]. Eu acho que isso é um desafio gigantesco para o jornalista e para a comunicação em geral.

Cristina Aragão. (Foto: Matheus Santos)

Em função da busca pela democratização do acesso, as matérias da Revista Brasileira da ABL podem ser lidas gratuitamente na internet através do acesso ao sítio eletrônico da Academia (https://academia.org.br/publicacoes/revista-brasileira). Nesse sentido, Cristina Aragão destaca que as matérias possuem uma linguagem mais leve e acessível a todos. 

- “A gente quer quebrar um pouco essa ideia de que texto é uma coisa pesada, enfadonha”, explicou Cristina.

Para os futuros jornalistas a serem formados pela PUC-Rio, Rosiska Darcy deixou as seguintes palavras sobre a centralidade que a comunicação exerce no atual contexto tecnológico: 

- Vocês são os jornalistas. Vocês vão encarar um mundo de comunicação hoje muito minado e, ao mesmo tempo, dominante. É ele que determina a sociedade, as vidas, os comportamentos, a intolerância, enfim. Tudo está nesse mundo da comunicação, sendo ela mais central do que jamais foi. Lamento dizer, mas vocês têm uma responsabilidade profissional muito grande que a mídia sempre teve, mas que dessa vez é mais grave porque os obstáculos são maiores, novos e desconhecidos. Todo mundo da internet é uma esfinge: é decifra-me ou te devoro.

Rosiska Darcy, Profª Rose Esquenazi e aluna. (Foto: Matheus Santos)

Mais Recentes
Os vários papéis da polícia no Mundo Atlântico
Encontros da História da PUC-Rio reuniram palestrantes da Itália, México e Brasil
Alunos terão desconto em moradia universitária
PUC-Rio fechou parceria com Uliving, maior rede deste tipo de serviço no país