A participação feminina no Oscar
08/03/2024 18:53
Carolina Bottino

A professora e roteirista da PUC-Rio Melanie Dimantas avaliou os preconceitos de gênero que também acontecem no audiovisual brasileiro

Foto: divulgação

A principal premiação do cinema vai ocorrer dia 10 de março, no canal TNT. Neste ano, a festa do Oscar pode ser histórica. Com a indicação de Lily Gladstone e Justine Triet, a 96ª edição da premiação poderá consagrá-las como a primeira nativa-americana a ganhar a estatueta de Melhor Atriz e a quarta mulher na história a vencer o prêmio de Melhor Direção. Apesar dos feitos significativos, nos últimos anos, a premiação mais popular de Hollywood enfrentou críticas sobre a falta de representatividade em suas categorias. 

Em 2016, pelo segundo ano consecutivo, nenhum artista negro ou latino havia sido indicado nas principais categorias de atuação. Na época, alguns atores anunciaram boicote à cerimônia, o que ampliou a discussão sobre a composição da equipe de membros votantes e a ausência de representatividade nas premiações. Desde 2020, existem regras para que as narrativas estejam aptas à indicação ao Oscar. Por exemplo, ter pelo menos um protagonista pertencente a um grupo étnico ou racial sub-representado, ter histórias que incluam mulheres, pessoas da comunidade LGBTQIAP+ e com deficiência. Além disso, foram ampliadas as oportunidades de estágio para pessoas que fazem parte desses grupos.

Como funcionam as indicações?

Com cerca de 12 mil membros votantes, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas é composta por pessoas ligadas à indústria do cinema. Cada categoria é votada por profissionais da mesma área - diretores podem apenas nomear outros diretores, atores indicam atores etc. - com exceção à estatueta de Melhor Filme, em que todos os membros ativos podem votar nos indicados e no vencedor. No caso de Melhor Filme Estrangeiro, cada país possui seu comitê, que poderá escolher um longa para essa categoria.

O Oscar ainda possui falhas na representatividade por trás das câmeras. Mesmo tendo consagrado as diretoras Chloé Zhao e Jane Campion, na categoria de Melhor Direção por dois anos seguidos, nas premiações de 2020 e 2023 apenas homens foram indicados à estatueta. A edição de 2021 foi a primeira e única a indicar duas mulheres, com a vencedora Chloé Zhao por "Nomadland", e Emerald Fennell, que concorreu por "Bela Vingança". Em 96 anos de premiação, apenas três mulheres venceram Melhor Direção - além das citadas, Kathryn Bigelow foi a primeira a ganhar a estatueta em 2010, por "Guerra ao Terror".

Além de "Anatomia de uma Queda", dirigido por Justine Triet, a cerimônia possui outros 14 filmes dirigidos ou co-dirigidos por mulheres que estão concorrendo em 28 categorias. A edição de 2024 do Oscar ainda possui “Barbie”, disputando com oito indicações, incluindo Melhor Filme e Melhor Roteiro Adaptado para Greta Gerwig, e “Vidas Passadas’, dirigido pela cineasta sul-coreana Celine Song, que foi indicada a Melhor Roteiro Original e Melhor Filme.

Na primeira vez concorrendo à premiação, Da'Vine Joy Randolph, favorita da crítica especializada, pode ser a décima primeira atriz negra da história a ganhar nas categorias de atuação por seu trabalho em "Os Rejeitados", indicado a outras quatro estatuetas.

Tratamento diferenciado

Roteirista do longa "Carlota Joaquina, Princesa do Brazil", a também professora da disciplina de Oficina de Roteiro II, da PUC-Rio, Melanie Dimantas discute sobre a presença feminina por trás das câmeras. Ao dialogar sobre a diferença de tratamento entre roteiristas homens e mulheres, ela afirma que muitas vezes, para não perder o trabalho, era necessário aceitar ser paga apenas quando o projeto começasse a ser produzido. Mesmo que o roteiro seja a primeira parte a ser feita de qualquer obra, iniciada ou não. No caso de roteiristas homens, que geralmente recebem mais apoio financeiro, isso acontece com uma frequência menor.

A professora e roteirista Melanie Dimantas. Foto: Acervo pessoal

– Existe o mansplaining do mercado, que é projetado de uma forma que ecoa e você acaba recuando para não perder o negócio. Durante muitos anos me chamavam para escrever, mas eu só iria receber depois que o filme fosse produzido. Foi uma batalha que fui deixando de lado, porque tive filhos e até então pensava: "ah, estou trabalhando porque eu curto". Mas não, não era só por isso, eu também precisava do dinheiro. Eu não tinha muita coragem de discutir a questão financeira, como se fosse feio fazer isso. Para o lado dos homens, muitas vezes é pensado; "ah, mas ele tem uma família". Mas ninguém via que eu também tenho uma família.

O termo mansplaining é utilizado quando um homem explica de maneira simplista algo a uma mulher em um contexto que ela já domina, desconsiderando que ela já sabe sobre o que está falando.

A partir daquele momento, Melanie começou a selecionar mais seus projetos, dando prioridade àqueles que a valorizassem financeiramente também, mesmo nos períodos de pré-produção. "Tomei a iniciativa de pensar que não poderia trabalhar sem receber, o que me fez passar por chata. Muitos diziam que não havia financiamento. Para mim, era doloroso dizer não porque precisava do trabalho, mas precisava me impor", revelou a roteirista.

Ao comentar sobre o Oscar, a professora Melanie dá destaque a "Vidas Passadas". Para ela, o filme traz uma perspectiva delicada e ao mesmo tempo forte e profunda sobre as possibilidades da vida, ressaltando o trabalho da diretora Celine Song na construção da narrativa.

A premiação mais famosa do cinema vai revelar os vencedores das 23 categorias em uma cerimônia no Dolby Theatre, em Los Angeles.

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