Rio das Pedras: 23 anos depois
13/12/2023 16:50
Marina Mann

Nova pesquisa mostra diferenças na percepção dos moradores sobre a favela

O professor Alkmin mostrou os resultados da pesquisa. Foto: Mateus Monte

Terceira maior favela do Brasil e com mais de sete décadas de existência, Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, mudou muito nos últimos 23 anos. A partir da pesquisa realizada por alunos da disciplina "Métodos e Técnicas de Pesquisa I", do Departamento de Ciências Sociais, foram revelados aspectos inéditos dessa comunidade. Se anteriormente, os moradores eram quase todos nordestinos e viviam sem a sombra do tráfico de drogas, agora o que predomina é uma nova geração nascida na cidade, convivendo com a violência de um poder paralelo. Coordenado pelo professor Antônio Carlos Alkmin, o projeto apresentou, no dia 6 de dezembro, na PUC-Rio, as questões mais importantes da vida dos 323 moradores entrevistados. O encontro contou com a presença da Vice-Reitora de Extensão e Estratégia Pedagógica, professora Jackeline Farbiarz, que  representou o Reitor Padre Anderson Antonio Pedroso, S.J.

As principais queixas foram as seguintes: saneamento básico, segurança, desenvolvimento sustentável e o consumo de água poluída.  O primeiro levantamento foi realizado pela primeira vez nos anos 2000 e, agora, os dados foram atualizados e comparados. Participaram do estudo alunos de duas gerações da PUC-Rio, atores locais, como profissionais das clínicas da família, e moradores que fundaram a Agenda Rio das Pedras 2030. É uma organização social que tem como intuito desenvolver políticas públicas para a transformação socioambiental na comunidade.

Alkmin relatou sua experiência com a disciplina. Foto: Mateus Monte

Rio das Pedras fica em uma região plana e não vertical, como a maioria das comunidades existentes no Rio de Janeiro. A força nordestina é muito forte porque foram os primeiros moradores da favela, quando ela surgiu na década de 1950. Eles buscavam emprego na Barra da Tijuca, que começava a ser ocupada. Em 2023, já existe uma porcentagem significativa de cariocas, filhos dos imigrantes que participaram da primeira pesquisa. Além disso, muitas pessoas pararam de frequentar cultos religiosos católicos. No entanto, não houve um crescimento de evangélicos, como ocorreu em outras localidades da cidade.

Em 2023, já pode ser observada uma mudança em relação à segurança e violência. Os moradores disseram que se sentem mais inseguros, em comparação há 23 anos. Mas não acham que é um problema só da comunidade e sim da cidade do Rio de Janeiro como um todo. Um fator que permaneceu nas respostas foi a falta de saneamento básico. Junto à pesquisa, veio um estudo sobre a qualidade da água. Rio das Pedras, que deu nome à comunidade, nasce limpo na Floresta da Tijuca. Mas no trajeto pela favela, sofre alterações em relação ao pH, temperatura, poluição até desaguar na Lagoa da Tijuca.

O professor de sociologia da UERJ e da UFRJ Afrânio de Oliveira Silva, que fez parte do primeiro grupo de pesquisadores, e o professor Antônio Carlos Alkmin explicaram  que  foram feitos oito pontos de coleta em uma parceria com o Laboratório de Limnologia da UFRJ. A poluição da água afeta a vida dos moradores e atinge até a água encanada que chega às  casas. Professora de ciências e biologia Renata Clemente, que trabalha no Laboratório de Limnologia, afirma que a saúde tradicional e emocional está diretamente relacionada com a qualidade da água consumida. "A água é vista como vilã para os moradores.  Sob o sol fica com mau cheiro e, com chuva, inunda. O Estado não está presente ali.”

Outro ponto relevante observado nas respostas do questionário foi a diminuição da renda per capita. Em 2000, este número chegava a 1,4 salário mínimo e, hoje, passou a um salário mínimo. A quantidade de pessoas por família diminuiu, mas o número dos que trabalham aumentou. A economia dentro da favela é muito forte, e cerca de 60% das pessoas trabalham em Rio das Pedras. Também ocorreu um aumento significativo no nível de instrução. Mais gente completou o Ensino Fundamental, o que representou uma melhora para a favela, mas este índice ainda está abaixo da média se comparado ao Brasil.

A palestra reuniu estudantes, moradores de Rio das Pedras e colaboradores da pesquisa. Foto: Mateus Monte

Durante a pesquisa, os moradores tiveram a preocupação de saber como eles seriam representados. Isso porque o estudo traz dados e números, mas por trás disso existem muitas outras realidades. José Carlos da Silva, conhecido como Carlinhos, por exemplo, é eletricista que nasceu no Rio das Pedras. Ele afirma que na favela existe um povo unido, trabalhador, realmente capacitado para transformar a comunidade em algo melhor.

Fizeram parte do trabalho do professor Alkmin, João Mauro Pereira de Albuquerque Lins, diretor do Instituto Prover (InPro) e ex-aluno da disciplina, e o diretor do Departamento de Ciências Sociais, e o professor Marcelo Burgos, autor do livro A Utopia da Comunidade: Rio das Pedras uma favela carioca, inspirado na primeira pesquisa. João Mauro disse que ficou feliz em ver mais de 40 voluntários que se dedicaram a produzir ciência. "Esse processo aconteceu através da união das pessoas". No encontro na PUC-Rio, 50 moradores foram convidados para escutar, em primeira mão, os  resultados dos questionários. Para eles, é importante a existência do programa de turismo que percorre a favela e traz sentimentos de pertencimento. As pessoas se sentem felizes de viver, lutar e sobreviver na favela Rio das Pedras.

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