Pequenas ações para uma cidade sem barreiras
12/09/2016 18:15
Cecília Bueno e Diana Fidalgo

Arquitetos discutem projetos urbanos para cidade mais inclusiva no seminário Inclusive, sobre acessibilidade, na PUC-Rio

“­Não nos interessa mais a cidade adaptada para uma minoria. O que queremos é a cidade adequada para todos”, reforçou o arquiteto e urbanista Ricardo Esteves, professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Rio, em mesa-redonda sobre acessibilidade e espaços urbanos no Inclusive – 1º Encontro PUC-Rio de Sensibilização, Acessibilidade e Inclusão + II Semana de Acessibilidade PUC-Rio, que teve início no dia 8 e vai até sexta-feira, 16 de setembro, em que se debateu o legado das Olimpíadas e a expectativa de cidades inclusivas, considerando que 6,2% da população brasileira tem algum tipo de deficiência, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

Depois de defender as vantagens econômicas de uma cidade com circulação universalizada, o especialista fez um chamado aos profissionais, acadêmicos e alunos da área:

– Nós, projetistas, queremos sempre fazer o extraordinário: um projeto de arquitetura que vire um paradigma, que resolva um monte de problemas. Mas o grande passo está em pensar que o extraordinário é, na verdade, o simples. Só precisamos olhar para as cidades. Basta caminhar pelas calçadas para perceber a quantidade de obstáculos. É o piso desnivelado, o buraco, o degrau. A solução muitas vezes não é nem tão complexa. São situações que podem ser resolvidas, mas isso requer uma visão política da cidade como espaço de inclusão.

Também professora de arquitetura da PUC-Rio e coordenadora de paisagismo do projeto do Parque Olímpico, Claudia Escarlate destacou que as recém-encerradas Olímpiadas do Rio possibilitaram a execução de muitos projetos de inclusão, com destaque para a acessibilidade:

 – Foi feito um trabalho de sensibilização dos projetistas e dos chefes de obra, que tiveram que passar um dia sobre cadeiras de roda para terem a dimensão do universo do cadeirante – contou, acrescentando:

– Quando se pensa em um projeto desses, é preciso pensar também no legado. Toda a infraestrutura que alimenta esse parque tem que ser usada no futuro para o desenvolvimento dessa área.

Tendo como exemplo as obras dos Jogos de Londres de 2012, a Arena do Futuro foi projetada dentro da concepção de expansão do legado para outras áreas: depois de usada para o handebol nas Olimpíadas e o goalball nas Paralimpíadas, será desmontada e desmembrada em quatro escolas públicas, duas na Zona Oeste e duas na Zona Norte, para 500 alunos cada uma. Todo o processo foi pensado na lógica de desmontagem, estocagem e remontagem de elementos, com 80% reaproveitados na construção das escolas.

A Arena do Futuro, que será remontada como escolas. Divulgação
 

– Todos os materiais e as técnicas foram escolhidos a partir da compreensão do que seria o espaço da escola, e como isso temporariamente se vestiria de arena. Então pensamos o processo ao contrário. Não uma arena que vai virar escola, mas uma escola que vai virar arena – contou a professora de arquitetura da PUC-Rio Ana Paula Polizzi, sócia da Oficina de Arquitetos, responsável pela construção da Arena do Futuro. Destino semelhante terá a Arena Carioca 3. O palco da esgrima, do taekwondo e do judô paraolímpico vai ser transformado em um Ginásio Experimental Olímpico (GEO), escola em tempo integral com formação esportiva para mil alunos.

Acessibilidade em favelas

Arquivo

 A acessibilidade em favelas foi outro tema abordado. Professora da FAU/UFRJ e sócia da Arquitraço – escritório que desenvolve projetos em favelas e bairros degradados da cidade –, Solange Carvalho destacou a diferença de atuar em projetos de inclusão urbana em áreas fora dos parâmetros da cidade formal:

– Estamos falando de locais com dificuldade de circulação. A estrutura das favelas é quase labiríntica, com passagens estreitas e sem identificação das ruas. Nesses casos, pequenas ações, como colocar corrimão em uma escadaria, ou a implantação de placas nas ruas já são um avanço no processo de inclusão.

Segundo a especialista, a inclusão nesses locais está ligada diretamente à circulação dos moradores dentro e fora das favelas. Além de propor obras de infraestrutura que permitam a integração com transportes urbanos, Solange sugere modalidades alternativas de transportes, como mototáxis e tuk-tuks indianos.

 – Precisamos pensar em uma cidade inclusiva, onde não existam barreiras, ou onde se tente acabar com essas barreiras – conclamou a professora de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Rio e supervisora do Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo Vera Hazan, mediadora da palestra, que foi traduzida em tempo real por intérpretes de Libras.

Acesso a serviços e lazer

Na sexta-feira, 9, participaram do encontro o paratleta de voleibol sentado José Mauro Vilarinho; o ator do Projeto Palavras Visíveis, Silas Queiroz, deficiente auditivo; e o designer Fred Gelli, co-fundador da Tátil Design e um dos diretores da cerimônia de abertura e de encerramento das Paralimpíadas.

Ironizando o fato de os deficientes auditivos não poderem participar das Paralimpíadas – “Somos o primo rico da família, aprendemos a sobreviver” – Silas citou situações banais do cotidiano que se tornam grandes dificuldades para os deficientes, e cobrou:

– Para desbloquear um cartão, não posso fazer pelo telefone; preciso ir até a agência do banco para falar com o gerente, que muitas vezes não tem intérprete. Outra situação é que não há legenda disponível 100%. Pagamos uma série de impostos, o mínimo que deveríamos ter são informações que contribuíssem com nossa vida.

José Mauro, que teve sequela de uma poliomielite, destacou o papel do esporte na integração da pessoa com deficiência:

– Não podemos colocar o deficiente dentro de uma caixa. O deficiente vai cada vez mais se encolhendo por não conseguir render tanto quanto os outros. Muitos nem vão à praia.

O paratleta participa do projeto Praia para Todos, que permite a cadeirantes banhos de mar, voleibol sentado de praia, surfe adaptado, frescobol, handbike e piscina infantil, em Copacabana e no Posto 3 da Barra da Tijuca.

– Pondo o sonho em evidência, não existem barreiras que nos prendam. Precisamos que as pessoas tirem o deficiente de casa. Às vezes a família dificulta porque não quer expor o deficiente na rua, que é violenta. Mas proteger vai limitá-lo. Ele precisa sair, se mexer, respirar a realidade – defendeu Mauro.

Gelli destacou que a palavra inclusão parte do princípio de que as pessoas estariam excluídas e precisariam ser incluídas: “Muitas não se sentem excluídas. A palavra é convivência”.

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