Eriberto Leão: diálogo pavimenta conexão entre ator e diretor
20/04/2017 17:31
Natália Oliveira

Ao lado do cineasta e professor Marcelo Taranto, o ator indica, a alunos de Cinema, como construir boas relações nas filmagens. 

A qualidade de uma produção audiovisual depende, entre outros atributos, da afinação profissional entre atores e diretor. Embora elementar, a proposição nem sempre é suficiente ao entrosamento desejado. Para alcançá-lo, a abertura ao diálogo segue uma das principais recomendações, lembraram o cineasta e professor da PUC-Rio Marcelo Taranto e o ator e cantor Eriberto Leão, nesta segunda, em encontro com alunos do curso de Cinema da Universidade.

A construção de relacionamentos pródigos nos sets de filmagem não raramente é prejudicada, reconhecem eles, por "falta de observação e de humildade" tanto de diretores quanto de atores. A liberdade na conversa, ressaltam, provém da segurança desenvolvida no trabalho.  

Profissionais propõe o diálogo como melhor solução. Foto: Matheus Aguiar

Convidado de Taranto para o encontro na PUC-Rio, Eriberto considera a "conexão entre o ator e o diretor" decisiva à qualidade das produções de cinema, teatro, tevê. Para se construir esta conexão frequentemente delicada, complexa, o ator indicado ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro em 2015  destaca o papel primordial das concessões mútuas:

– É preciso saber com quem se está trabalhando. Se você não gostar do cara, não vá trabalhar com ele. Você tem que confiar no diretor. Mas o gosto pessoal deve ficar em segundo plano –  ressalva – Já fiz muitas concessões na minha carreira, e isso é normal dentro do cinema, da televisão e do teatro.  

Os choques entre as percepções do ator e do diretor na filmagem mostram-se relativamente comuns, admite Eriberto. Não devem, todavia, cultivar impasses e conflitos nocivos à busca comum da excelência da produção. Para Eriberto, é fundamental que "os egos do ator e do mentor" não se sobreponham, por exemplo, à melhora do roteiro. Ele garante: "o diálogo é possível" desde que o ator tenha o domínio do personagem e o diretor, humildade:

– Pequenas mudanças [no roteiro] sempre vão ocorrer. O que faz a diferença é a liberdade que se tem com o diretor para mudar as estruturas do roteiro. Mas eu só posso dar uma opinião, neste sentido, quando tenho propriedade, quando estou muito inteirado no meu personagem. E cabe ao ator ouvir o que o diretor tem a dizer. Ele pode ou não concordar com a opinião do ator. Isso fica mais difícul quando os egos são inflados. É preciso humildade, sem perder a identidade narrativa. É por meio dos pés no chão que nos tornamos gigantes.

Com experiência profissional também na direção, Taranto reconhece a importância do diálogo e da humildade para se construir relacionamentos profissionais favororáveis à filmagem. Por outro lado, ele pondera: não se deve deixar o ator "solto no set". Na opiniáo do especialista, um bom diretor consegue perceber o momento em que o intérprete está mais inspirado e, assim, tirar o melhor dele. Para Esta melhor performance Para isso ocorrer, é preciso que ele não fique, somente, preocupado com os equipamentos e com os enquadramentos da câmera.

– Não se deve abandonar o ator no meio do set. Há diretores que ficam tão ligados na câmera e em seus movimentos que, de repente, o ator fica abandonado. Um momento muito difícil para o ator. Minha técnica é dividir o set em dois: o universo da técnica e o universo do ator. O ator quer essa aproximação, apesar muitos diretores quererem ficar na aparelhagem – observa o professor de direção cinematográfica.

Ao lado de Eriberto, Taranto relembrou, no encontro com os estudantes, uma das histórias que mudaram-lhe a visão profissional. Nas filmagens de A Hora Marcada (Taranto, 2001), ele conta que atriz Ester Góes "o ensinou a ouvir o ator quando ele pede para iniciar a gravação":

– Eu estava filmando com a Ester e, enquanto terminava de arrumar os equipamentos, ela me falou: “Vamos rodar, Taranto”. Ester me deu uma aula, porque percebi que o ator vai construindo uma emoção. É como uma curva, vai subindo até chegar a um ponto que não há mais como você segurar.

Conexões assim entre ator e diretor, reitera Eriberto, revelam-se indispensáveis ao sucesso de um filme, uma novela, uma peça:

- O ator depende do diretor, se ele quer, por exemplo, a interpretação de uma forma explicita ou não. Há uma interdependência muito grande entre os atores e o diretor. Se o diretor acredita no take único, eu também acredito. Entro em cena com uma osmose muito grande com o diretor. Cada um tem o seu estilo. Acho importante, assim, o ator se metamorfosear para trabalhar com diferentes mestres.

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