Quando o poder aquisitivo aproxima e afasta as pessoas em uma cidade
20/10/2023 17:44
Ana Tonelli

No Seminário Circuito Urbano, professor de Arquitetura questiona como os territórios são ocupados por ricos e pobres

Professor Amaro Marques é o organizador da palestra Circuito Urbano. Foto: Mateus Monte

O professor Amaro Marques, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU) da PUC-Rio, vai ministrar o seminário Circuito Urbano, no dia 23 de outubro, às 15h, na sala 4 do IAG. O encontro é uma parceria do DAU com o Grupo de Pesquisa em Produção do Território e de Territorialidades e tem chancela da ONU-Habitat, programa das Nações Unidas para os Assentamentos Urbanos. O debate terá como tema o desenvolvimento sustentável e a produção do território negro nas cidades brasileiras.

O objetivo do seminário é entender qual o efeito das medidas propostas pela ONU-Habitat nas áreas marginalizadas que são principalmente ocupadas por pessoas negras. Além dos alunos de arquitetura, o grupo de pesquisa vai receber estudantes de diversas áreas. Coordenador da palestra e líder do grupo de pesquisas, o professor mineiro que mora há nove meses no Rio de Janeiro, estuda a urbanização a partir do olhar étnico.

De acordo com o pesquisador, as cidades não são construídas para as pessoas pobres, o que ocasiona a segregação social. Seu estudo é voltado para como são construídos e ocupados os quilombos e periferias. Áreas como a Pequena África, na Zona Portuária do Rio, onde mais de um milhão de escravizados desembarcou, são a representação de como historicamente a raça é definidora de território.

—  A  concentração de renda marca o acesso ou não a lugares da cidade. O poder aquisitivo abre e fecha portas, afasta e aproxima as pessoas. Quando dividimos a cidade, vemos que as piores áreas são ocupadas por pessoas pobres, e a pobreza no Brasil é negra.

A Pequena África é símbolo de como a etnia define a ocupação dos territórios. Foto: Rose Esquenazi

Os territórios retratam a época em que foram construídos, os estilos arquitetônicos e também o contexto social. Segundo o professor, a cidade está ligada à preservação da história, porém apenas de uma parte dela. Há hegemonia da sociedade escravocrata e esse perfil está reproduzido nas zonas urbanas. Marques ressalta o apagamento de parte do passado, presente nas obras dos povos originários e de afro-brasileiros.

— A preservação da história muitas vezes é resumida ao estilo europeu e deixa de lado construções de pessoas negras e indígenas. Por exemplo, existiam quilombos no Leblon, Zona Sul do Rio, mas foram apagados. É preciso preservar a história de todos os povos sem exceção.

Marques afirma que em cidades litorâneas, como o Rio de Janeiro, áreas planas e próximas à faixa de areia são reservadas aos que possuem poder aquisitivo. A parte pobre da população busca imóveis mais baratos em zonas sem arborização, lazer e ação presente do Estado. A organização da cidade priva parte dos cidadãos dos direitos básicos.

Segundo o levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), 53% dos moradores do Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio,  enfrentaram insegurança alimentar grave em algum momento entre 2020 a 2022. Em meio à desigualdade social, esse é um dos cenários em que a ONU-Habitat pode atuar.  Um dos importantes temas do seminário Circuito Urbano.

Diferentes cidades mesma segregação

No dia 23 de outubro, o seminário Circuito Urbano reuniu palestrantes de Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro para debater o histórico da urbanização nas cidades e a perspectiva de um futuro sustentável para elas. Participaram da conversa o professor Marcelo Motta, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU), Hêdu Ribeiro, mestrando da UNIMONTES (Montes Claros-MG), Clóvis Nascimento, mestre em Arquitetura e Urbanismo pela PUC-Rio, Rita Ribeiro, coordenadora do centro de pesquisa e design da UEMG e Maria Estela Ramos, coordenadora do Escritório Modelo da União Metropolitana de Educação e Cultura (BA). 

Cada painelista abordou a organização e perfil de habitação do estado que estudam. O geógrafo Marcelo Motta ressaltou o histórico da apropriação de territórios no Rio e apontou a importância da existência de uma reflexão crítica sobre o planejamento das cidades. Já Hêdu Ribeiro explicou como a produção social de moradia e o sonho da casa própria sofrem com a lógica de dominação das classes. Como forma de combate à segregação social, Maria Estela propôs um planejamento integrado e conscientização coletiva para uma ocupação urbana mais justa.

Clóvis Nascimento e Rita Ribeiro discutiram as relações urbanas para além da moradia. Por meio da música e da dança, os pesquisadores estudaram a ocupação das ruas pelo povo. Ao contar a história do movimento Baile Black, em São Paulo, Nascimento falou sobre a segregação e a dificuldade de acesso ao lazer e à segurança para moradores da periferia. O Quarteirão do Soul, grupo de dança que ocupa as ruas mineiras, foi usado por Rita como exemplo de intervenção urbana e mobilização pública. 

A respeito das metas de desenvolvimento sustentável estabelecidas pela ONU-Habitat, os palestrantes concordaram que são objetivos pouco realistas. Mas disseram que é preciso debater o assunto para que lógicas segregacionistas não sejam reproduzidas. O Circuito Urbano tem a função de promover grupos de pesquisas como o de Produção do Território e de Territorialidades do DAU da PUC-Rio.

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