Literatura e a busca por reparação
25/09/2023 17:23
Carolina Bottino e Eduarda Farias

Professores do Departamento de Letras e seus convidados debatem sobre os processos de identidade de diferentes culturas

A escritora Claudia Lage, o decano do Centro de Ciências Sociais Julio Diniz e o professor Alexandre Gefen discutem a reparação histórica na literatura contemporânea. Foto: Mateus Monte

Nos dias 12 e 13 de setembro, o Departamento de Letras promoveu o Colóquio Internacional Literatura e Relação: da apropriação às novas divisões. As palestras, que ocorreram no RDC, foram organizadas pela professora Ana Kiffer, do Departamento de Letras, e Alexandre Montaury, diretor do Departamento.

A professora explicou que o colóquio possui um objetivo acadêmico, iniciado a partir de sua pesquisa como cientista da CNPQ e também das ideias de Montaury, do escritor e professor francês Alexandre Gefen e da tradutora francesa Tiphaine Samouyalt.  O projeto, que vai se desdobrar em Paris, ano que vem, busca testar a hipótese da literatura contemporânea como um fator que amplia a leitura para diferentes culturas, com um caráter relacional, saindo da ideia da autonomia da arte como se pensou na modernidade.

Durante o encontro “Práticas reparadoras do irreparável”, mediado pela professora Aza Njeri, coordenadora da Graduação de Letras, o crítico francês Jacques Leenhardt e o historiador do Museu da República Eduardo Possidônio debateram a questão da intolerância aos membros do candomblé ao longo da história e do arquivamento dos casos de invasão aos terreiros, que sofrem perseguição até hoje. Além disso, Eduardo criticou a relação dos museus com as populações que vivem mais afastadas das grandes cidades, aumentando a desigualdade no acesso a esse tipo de conhecimento.

– São poucos os museus que conseguiram preservar a história do candomblé, o que demonstra a cultura epistemológica de poder. Há também a questão do acesso aos museus, pois geralmente estão centralizados nas capitais, e tornam-se de difícil acesso para aqueles que vivem no interior do país. Preservar esse acervo e dar visibilidade  também é dever do Estado.

O decano do CCS, Julio Diniz, mediou palestra no Colóquio Internacional Literatura e Relação. Foto: Mateus Monte

Na palestra “A literatura contemporânea e a busca da reparação”, o tema central foi discutido pelo professor Julio Diniz, decano do Centro de Ciências Sociais, a escritora  Claudia Lage e o professor Alexandre Gefen. Os três enfatizaram a importância de dialogar sobre as questões que envolvem memória. Segundo  Claudia Lage, a literatura passa a não ter mais um papel apenas de ruptura, mas de união com a identidade cultural no pós-modernismo.

A professora do Departamento de Letras Patrícia Lavelle mediou a mesa “A literatura contra a violência?”, com a participação do tradutor e  professor de literatura francesa Marcelo Jacques de Moraes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e do escritor Carlos Eduardo Pereira,  ex-aluno da graduação de Letras da PUC-Rio. Marcelo de Moraes fez uma análise sobre como a tradução pode ser uma forma de violência. O tradutor se referiu ao desaparecimento de línguas originárias, à imposição de uma língua austera e aos sentimentos de potência e impotência que podem existir no ato de traduzir.

Em uma retrospectiva de seu trabalho, Carlos Eduardo Pereira citou diferentes formas de violência que seus livros já abordaram. Em “Dias de Domingo”, uma coletânea de contos do qual fez parte, ele escreve sobre a violência de rua por meio da história de uma chacina no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Outra perspectiva trabalhada por ele é a descriminação, que apareceu em seu romance “Enquanto os dentes”, com Antônio, personagem cadeirante, negro e homossexual que, ao longo da narrativa, revisita a memória marcada por violências.

Palestra “A literatura contra a violência?” recebeu Carlos Eduardo Pereira, Patrícia Lavelle e Marcelo Jacques de Moraes. Foto: Caio Matheus

Na última mesa do colóquio, o professor e pesquisador Gabriel Giorgi, da New York University, e o historiador e arqueólogo da moda andina, Adrian Ilava, mediados por Alexandre Montaury, debateram o tema “Violência e relação”.  Giorgi, de origem argentina, apontou a linguagem como base da relação na sociedade. Ao se referir à ancestralidade, à colonização da América Latina e à necessidade de escuta para a justiça, o professor descreveu a linguagem comum como força de embate à autoridade letrada.

Ilava analisou as violências que a cultura inca sofreu com a colonização e as mudanças principalmente na moda, sua área de atuação. Ele detalhou que o wak’a - espiritualidade andina, que significa sagrado e divino - está presente em todos os lugares e pode ser representado de diversas maneiras. A religião, segundo ele, se afasta do conceito ocidental de colocar o ser humano no centro e observa todos os seres vivos como iguais, sem superiores.

A professora Ana Kiffer celebrou o resultado das mesas que considerou um sucesso diante do objetivo de “incomodar”, provocando o pensamento da plateia.

— Sempre foi um critério muito importante que os palestrantes não falassem a mesma língua, seja pela nacionalidade, campo de pesquisa e ponto de vista. Queríamos colocar para conversar pessoas que nunca conversariam, nunca se escutariam. Todos fizeram esforço de ir em direção de uma troca, então, com isso, fiquei super feliz com o resultado do colóquio.

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