O uso de biocarvão na terra aumenta a produtividade de pastagens degradadas e melhora a qualidade do solo. Esta é a conclusão da pesquisa Biochar amendment improves degraded pasturelands in Brazil: environmental and cost-benefit analysis, da professora Agnieszka Latawiec, do Departamento de Geografia e Meio Ambiente da PUC-Rio. O artigo foi publicado em agosto, na revista Scientific Reports, do grupo Nature Research.
Os resultados apontam que houve um aumento de 27% na produção de gramíneas forrageiras, plantas muito utilizadas na alimentação de animais bovinos, equinos e caprinos. O biocarvão, que é feito a partir da queima de resíduos orgânicos, também melhorou a qualidade do solo e evitou que carbono fosse emitido diretamente na atmosfera.
Agnieszka conta que o interesse em trabalhar com biocarvão vem desde a época em que cursou o doutorado, que concluiu em 2009 na University of East Anglia, Inglaterra. Já no Brasil, fundou o Instituto Internacional para Sustentabilidade, do qual é diretora executiva, e a pesquisa saiu do papel em 2013. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) entrou como parceira no projeto e cedeu espaço em uma fazenda de 70 hectares em Seropédica, Rio de Janeiro, para a realização de uma parte da pesquisa. A outra parte foi realizada em laboratório para garantir um maior controle dos resultados.
- Eu sempre tive interesse pelo biocarvão porque ele nunca foi estudado no contexto de pastagens com Brachiaria, que é uma gramínea forrageira. O meu interesse foi juntar essas duas coisas, dado que as pastagens ocupam grandes áreas e estão ligadas ao desmatamento e à degradação do solo.
A pesquisadora explica que uma das razões para o desflorestamento no Brasil é a baixa produtividade da terra, porque, para aumentar o lucro, o produtor recorre à expansão da área em que trabalha. De acordo com o estudo, no Brasil, 70% das pastagens se enquadram nesta categoria. Agnieszka acrescenta que muitas queimadas saem do controle e destroem uma região maior do que a esperada. É nos cenários onde o fazendeiro já realiza a queima de resíduos que a professora acredita que a aplicação do biocarvão tem maior chance de ser bem-sucedida.
- Nas áreas rurais do Brasil há a necessidade de fazer a poda e, com isso, muito resíduo orgânico é queimado com plástico e outros resíduos. Outro problema dessa prática é que às vezes esses fogos se espalham nas áreas que não foram entendidas para ser queimadas, como a Mata Atlântica. O proprietário que já faz queima de qualquer forma pode realizar esse processo de forma mais inteligente.
Apesar dos benefícios, a professora ressalta que se surpreendeu com o alto custo da pesquisa. O lucro para o pequeno produtor de corte, observa, já é baixo, e adicionar mais um custo não compensa financeiramente mesmo com o aumento da produtividade. Segundo ela, isso ocorre porque o volume de biocarvão necessário nessas situações é muito alto, o que demanda mão de obra e tempo.
- O processo de revisão, para que esse artigo fosse aceito na Scientific Reports, foi muito fácil. Eu fui surpreendida, mas eles se interessaram exatamente por causa da honestidade sobre os custos. Mostramos que é necessário ter um olhar abrangente sobre o biocarvão. Não é só olhar a produtividade, mas também os custos, para ter uma visão mais holística da questão.
A professora do Departamento de Geografia e Meio Ambiente frisa que a técnica de trabalho com o biocarvão ainda está em desenvolvimento e, por isso, diz acreditar que, futuramente, os custos podem diminuir. Ela ainda acrescenta que existem casos, como no plantio de hortaliças, em que os resultados compensam por causa da escala menor de produção. Outra possibilidade para aumentar a lucratividade do processo, lembra, são os pagamentos por serviços ambientais.
Produtores podem ser compensados financeiramente de acordo com a quantidade de carbono que deixa de ser jogada na atmosfera com a produção do biocarvão. Na pesquisa, foram economizadas 91 toneladas de carbono como efeito poupa-terra e 13 toneladas que foram sequestradas do solo, o que equivale a um total de US$455 em crédito de carbono.
- Nós testamos na escala de um produtor familiar, os fornos são bem simples, um deles foi feito em buraco no chão, mas não qualquer buraco. Ele era inteligente, com paredes em 45 graus de angulação. Se o produtor coloca os resíduos orgânicos em camadas, por causa da parede, os gases que seriam liberados na atmosfera e respirados pela população acabam voltando para o sistema e sendo queimados.
Outra possível alternativa para o uso rentável do biocarvão é a aplicação dele junto ao fertilizante. A professora explica que o biocarvão funciona como uma esponja porque contribui para uma liberação lenta das propriedades do adubo e não pode apenas substituí-lo, porque não tem todos os micro e macro elementos necessários para a terra. Os próximos testes de Agnieszka vão abordar o uso do biocarvão aliado aos fertilizantes em gado de leite.
- Meu próximo passo é analisar os resultados de outro trabalho de campo no qual juntamos biocarvão e fertilizante, então ampliamos muito o experimento. Ele durou dois anos e teve 80 parcelas com três tipos de Brachiaria, com várias dosagens e mistura de biocarvão e fertilizante.
A professora conta que publicar o artigo na revista Scientific Reports foi uma grande realização. Agnieszka, que é polonesa, chegou ao Brasil em 2011, e teve que superar a barreira da linguagem para conseguir realizar o estudo.
- É uma realização do meu sonho pessoal e profissional, porque sempre tive interesse de trabalhar com biocarvão e pastagem. A busca pelo manejo mais sustentável da pastagem continua a ser minha linha de pesquisa favorita.