O primeiro dia da Conferência Anual da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável (SDSN), ocorreu em 27 de outubro, de maneira completamente remota. A economia circular e a recuperação sustentável pós-pandemia foi o tema deste do encontro deste ano, promovido pela PUC-Rio, que é a sede da secretaria executiva da rede. A abertura foi feita pelo Reitor da Universidade, padre Josafá Carlos de Siqueira S.J., que alertou para a necessidade de uma busca por novas medidas sustentáveis e inovadoras, uma vez que a economia não tem melhorado a qualidade de vida, a saúde e a educação de grande parcela da sociedade.
O Reitor afirmou que as mudanças climáticas, já visíveis no Brasil, estão ligadas aos desacertos do atual modelo econômico no país. Segundo ele, a pandemia gerou em muitas pessoas um sentimento mais solidário que impulsionou a criação de programas de auxílios econômicos emergenciais para estudantes de universidades, como é o caso da PUC-Rio, que oferece diversos programas que ajudam os estudantes com doações de computadores e pacote de dados. Ele apontou, no entanto, que houve um aumento de exclusões sociais, empobrecimento dos países emergentes e continuação de práticas insustentáveis.
O economista e professor da Universidade de Columbia, Jeffrey Sachs, fez uma participação em vídeo, direto do Vaticano, e, após agradecer à PUC por sediar a conferência, enfatizou que discutir o tema da economia circular é crucial para o desenvolvimento das nações. Ele assinalou que é fundamental achar um caminho para unir prosperidade, justiça social e sustentabilidade ambiental. Sachs ressaltou que a economia circular é parte da solução para as principais crises ambientais que o mundo enfrenta, devido ao potencial de diminuir os danos ao meio ambiente.
O Coordenador da Autoridade do Desenvolvimento Sustentável do Estado do Rio, Paulo Protásio, comentou as perspectivas para a conferência Rio +30, que será sediada na cidade em 2022, quando serão comemorados os 30 anos da realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente. Protásio foi um dos organizadores da ECO-92, que também ocorreu na capital fluminense e foi um marco do início dos eventos que debatem as diretrizes e acordos ambientais entre diferentes países. O advogado afirmou que é importante manter o clima amistoso de relacionamento entre os governantes, que ocorreu no primeiro encontro, e eliminar posturas adversárias, porque não há possibilidade de existir resultado positivo sem ação convergente. Para ele, é essencial o alinhamento das forças estratégicas por parte das instituições. Protásio também apontou para a importância das instituições de ensino, como a PUC-Rio, nesse processo.
Mudança sistêmica
O primeiro dia da conferência encerrou com um painel que abordou a história da economia circular no Brasil. O moderador do debate e integrante do comitê executivo da SDSN Brasil, Rodrigo Medeiros, começou o debate reforçando que a economia circular combate o uso indiscriminado de recursos naturais e de impactos ambientais. Ela procura suprimir a geração de resíduos, com a implantação de modelos de negócios nos quais os resíduos industriais ou de consumo se tornam matéria-prima para novas cadeias produtivas.
Diretora da Fundação Ellen MacArthur da América Latina, Luisa Santiago começou a estudar o tema há mais de seis anos, e, segundo ela, o grande objetivo da economia circular é promover uma mudança sistêmica na lógica de funcionamento da economia. É um modelo econômico que revoluciona e é regenerativo para o planeta, faz frente às crises que a humanidade enfrenta: climática, da perda de biodiversidade e de poluição. Luisa explicou que isso é resultado de um sistema linear que é predominante hoje: extrair, transformar e descartar.
- A economia circular se baseia em três princípios, que são a lente para enxergar o fazer da economia: eliminar resíduo e poluição; circular produtos e materiais dentro da economia; regenerar a natureza. É um modelo que gera melhor distribuição de riqueza, por meio de cadeias mais localizadas de produção e consumo; ou seja, por uma melhor distribuição entre atores, e entre países, inclusive. Gera também maior diversidade, cadeias e processos mais inclusivos - defendeu.
Para ela, é urgente pensar em políticas públicas no âmbito municipal, estadual e federal para que a economia circular ganhe a escala necessária. Ela afirmou que o governo federal vai na linha contrária e existe um desafio grande de abrir um capítulo de potencialidades proporcionadas pela agenda progressista. Com pós-graduação em gestão ambiental pela UFRJ, ela observou que a economia circular não é uma agenda de esquerda ou direita, mas sim de uma agenda progressista.
A fundadora da Exchange 4 Change Brasil, a engenheira química Beatriz Luz, defendeu que a economia circular não gera resíduos, porque não faz sentido existir nada que não tenha valor ao final de um processo produtivo, por isso é necessário redesenhá-los. Segundo a empresária, é uma nova lógica de negócios, mais regenerativos, que não gerem resíduos e poluição e vão contribuir para a redução dos impactos das mudanças climáticas. A Exchange 4 Change Brasil é uma organização cujo objetivo é incentivar uma transição para a economia circular no país ao apresentar e adaptar soluções globais à sociedade brasileira.
- Na sustentabilidade, estamos acostumados a falar dos Rs. Eu resumo em três: Primeiro, as indústrias têm que Reavaliar o processo produtivo, começar de novo, com novas matérias-primas, olhando para o final da cadeia e pensando como criar novos ciclos reversos. Segundo, Redesenhar produtos e serviços, nos quais está a questão do consumo, de como o mercado tem que estar preparado e educado para esses novos produtos, produtos passam a ser serviços dos consumidores usuários. Terceiro, Redefinir valores, atitudes, comportamentos e relações comerciais – explicou.
O gerente de sustentabilidade da FIRJAN, Jorge Peron, trouxe a perspectiva da indústria para a roda e alertou que, com a tendência do crescimento populacional e do consumo, a quantidade de recursos disponíveis no planeta não será compatível, mesmo com a indústria eficiente nos processos. Para ele, a economia circular é essencial, por isto, a Firjan posiciona a economia circular como estratégia desde 2016 e pauta políticas públicas e estratégias cooperativas. Além de auxiliar a capacitar e apoiar a aplicação de práticas e princípios de design circular em produtos e modelos de negócio, por meio de turmas e consultorias.
Por fim, Beatriz Luz provocou os ouvintes ao questionar a importância do mercado consumidor no processo de implantação da economia circular. E ainda ressaltou que a indústria tem um papel importante e deve auxiliar o consumidor a compreender a engrenagem deste processo.
- As indústrias produzem para o mercado. Se o mercado não estiver comprando, a indústria também vai ter que se modificar. É um ciclo. A indústria, que tem um olhar a longo prazo, também tem que educar o consumidor e ajudá-lo a mudar os hábitos.