À escuta do outro e do Espírito Santo
10/05/2022 16:59
Gabriel Meirelles

Sínodo convocado por Papa Francisco no ano passado dialoga com 1,3 bilhões de pessoas

Papa Francisco com outros bispos na abertura do Sínodo em Roma, em outubro de 2021 (Foto: Vatican News)

"Escutar". Esta é a palavra mais importante para entender a proposta do Papa Francisco com o Sínodo 2021 - 2023: Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão. Com este processo, o Sumo Pontífice pretende ouvir os fiéis católicos de todas as partes do mundo sobre as realidades de cada comunidade quanto à participação dos leigos e à forma de ser Igreja nestes locais. Para isto, o documento preparatório apresenta dez temas a serem debatidos nas paróquias. Dentre eles, o diálogo da Igreja com a sociedade e com outros segmentos cristãos.

As conferências episcopais do mundo inteiro têm até o dia 15 de agosto para enviar ao Vaticano as respostas da consulta feita junto aos fiéis sobre o tema da sinodalidade. Com os resultados obtidos dentro de cada país, a Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos vai elaborar o primeiro instrumento de trabalho em setembro. A reunião do Papa com os prelados será em outubro de 2023.

O Sínodo dos Bispos, apesar de ter sido institucionalizado em 1965 pelo papa Paulo VI, é um mecanismo utilizado desde o tempo de Jesus e da Igreja Primitiva. O diretor do Departamento de Teologia da PUC-Rio, padre Waldecir Gonzaga, destaca algumas passagens bíblicas e episódios da vida da Igreja em que houve reuniões consultivas de diversos fiéis. A principal é a Assembleia de Jerusalém, conhecida como o primeiro concílio da Igreja e narrada no capítulo 15 do livro dos Atos dos Apóstolos. Na ocasião, a comunidade cristã se reuniu para se ouvir e discutir sobre a necessidade ou não de os pagãos convertidos serem circuncidados.

– Tiago toma a palavra depois de escutar Pedro e todo mundo, e ali assume o compromisso de redigir a chamada carta do final do Concílio. Este texto é realmente muito significativo e muito bonito: ‘nós e o Espírito Santo decidimos não exigir nada mais a não ser isso’. O processo decisório de alguma coisa ali já foi sinodal, colegial, foi no diálogo – explica padre Waldecir.

O diretor do Departamento de Teologia ressalta que as contribuições dos fiéis leigos à Igreja colaboram para o equilíbrio entre tradição, magistério e Sagradas Escrituras. Segundo ele, sem esta escuta, os pastores poderiam estar a caminho de uma direção diferente das ovelhas. Ele lembra, ainda, o crescimento de mulheres na ocupação de cargos eclesiásticos e outras funções relacionadas à Igreja, como as professoras de faculdades teológicas em seminários.

Jovens e outros fiéis se reúnem para responder ao questionário (Foto: Divulgação / Paróquia Nossa Senhora da Piedade)

Padre Waldecir assinala que este movimento não é uma exclusividade do Papa Francisco. De acordo com ele, o Concílio Vaticano II (1962-1965) deu início a um processo de atualização de aspectos pastorais, com a preservação da doutrina da fé da Igreja. Segundo o religioso, os antecessores de Francisco, desde Paulo VI até Bento XVI, amadureceram os frutos do Concílio, e, agora, o Papa encontra um momento oportuno para esse tipo de consulta por conta dos facilitadores tecnológicos, que permitem uma interação global com rapidez e eficiência.

– Eu acredito que Francisco tem uma ousadia evangélica de dar passos, mas porque o tempo também é oportuno. O momento se faz oportuno porque foi amadurecido. O papa não constrói um caminho novo. Ele encontrou um caminho que já foi asfaltado, e agora ele coloca mais passos para facilitar aos futuros pontífices ou para a Igreja no amanhã.

Cardeal Dom Orani celebra missa de abertura do Sínodo na Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro (Foto: Gustavo de Oliveira)

Sentido de fé

Padre Rodrigo Dias participou da elaboração da síntese arquidiocesana e defendeu, no ano passado, sua dissertação de mestrado sobre o conceito de sensus fidei – sentido de fé – na PUC-Rio. O objeto de estudo dele ajuda a compreender a importância de a Igreja caminhar rumo à sinodalidade e à escuta de cada batizado. Segundo o pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, em Realengo, o conhecimento da fé católica não está relacionado ao estudo de Teologia, mas com a vivência prática da religião por meio dos sacramentos, vida de oração e busca pela santidade. Dessa forma, ouvir os fiéis leigos significa ouvir o Espírito Santo, que também se manifesta por meio deles.

– Todo o Povo de Deus (não só os bispos e o papa) possui uma graça sobrenatural peculiar de perceber um sentido de fé (sensus fidei). Na medida em que nós vamos vivendo o Evangelho e colocando em prática os ensinamentos do Senhor Jesus e da doutrina da Igreja, nós vamos ao longo da História percebendo instintivamente aquilo que corresponde e aquilo que não corresponde à mensagem do Evangelho.

O assessor para as Redes Sociais da Arquidiocese resgata uma expressão utilizada no número 15 do documento preparatório: “cada um à escuta dos outros; e todos à escuta do Espírito Santo”. Para padre Rodrigo, esta frase sintetiza a finalidade do Sumo Pontífice: ouvir a Deus por meio das colocações do povo. Ele frisa que o Sínodo é um mecanismo de escuta, mas a palavra final é do papa. O Santo Padre leva em consideração todas as informações coletadas para tomar suas decisões e escrever o documento final, se julgar necessário.

– Se nós ouvirmos (uns aos outros), nós perceberemos e ouviremos o Espírito Santo. Esta é a dinâmica. Se nós nos ouvirmos de verdade e falarmos daquilo que o Evangelho tem nos enchido o coração, o Espírito Santo vai prevalecer.

Comunidade unida em encontro sinodal (Foto: Divulgação / Paróquia Santo Antônio de Pádua e Nossa Senhora da Boa Vista)

Para o padre Rodrigo, apesar de os fiéis não estarem acostumados a participar de uma consulta originada da Santa Sé, os processos sinodais são comuns na Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro. Ele destaca os conselhos paroquiais e as assembleias vicariais como algumas das instâncias de escuta presentes na cidade. Por outro lado, o sacerdote acredita que a discussão nas igrejas locais e a participação dos leigos não se encerram com as respostas ao questionário. Para o padre, os católicos devem exercer, desde já, a sinodalidade na vida comunitária.

– Nós não estamos “dispensados” porque respondemos o relatório. É tempo de continuarmos discernindo o que aquela pergunta que vai ser entregue lá na frente ao Santo Padre ainda tem a repercutir na vida paroquial. Nós precisamos acompanhar com orações, com reflexões, amadurecendo aquilo que discutimos, falamos, ouvimos, para que nós possamos cada vez mais nos aprofundar na proposta do tema.

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