O brasileiro pode não se dar conta, mas é o povo mais preocupado do planeta com as questões climáticas. “O Brasil é reconhecidamente um dos países líderes no estilo mais limpo e sustentável”, afirmou o professor Bernardo Strassburg, do Departamento de Geografia da PUC-Rio, ao apresentar resultados de pesquisa do Pew Research Center, dos Estados Unidos, durante a Feira de Valores da Universidade Católica (Fevuc) no Anfiteatro Junito Brandão. Os resultados surpreenderam a plateia, que antes havia se dividido sobre os brasileiros levarem a sério a questão ambiental, e desconsiderou que fossem mais preocupados que o resto do mundo (apenas três pessoas ergueram as mãos). Os dados são de 2015, bem antes de o presidente americano Donald Trump rasgar compromissos assumidos pelo antecessor, Barack Obama, na Conferência de Paris sobre meio ambiente, mas permanecem desconhecidos da maioria da população.
Ainda de acordo com a pesquisa, 77% dos latino-americanos acreditam que as mudanças climáticas já afetam nossas vidas; a maioria dos entrevistados reconhece que são necessárias mudanças no estilo de vida pessoal; e que as mulheres e pessoas de orientações políticas de esquerda são mais abertas a mudar de comportamento são em sua maioria favoráveis a ações e políticas sobre mudanças climáticas. Por regiões, América Latina, África e Sudeste Asiático já eram mais preocupados que Europa, Canada e Estados Unidos.
Strassburg lembrou ainda que o Brasil foi o país que mais diminuiu as emissões de gás carbônico depois do Tratado de Kyoto. “O país não tinha nenhuma obrigação com o que foi acordado e mesmo assim foi um dos responsáveis pelo acordo ter saído. Somos o país que mais faz e quando nos analisamos sempre achamos que estamos fazendo pouco. Isso é bom”.
O centro americano vem conduzindo há dois meses outra pesquisa, sobre o que pensam brasileiros e poloneses sobre mudanças climáticas e sustentabilidade. Segundo o professor Rodrigo Pena Firme, também do Departamento de Geografia, o objetivo da pesquisa é pensar as questões ambientais pelo viés da cultura e das ciências humanas, das ciências sociais e da teologia, a fim de orientar e basear tomadas de decisão e criação de políticas públicas: “É uma pesquisa humana olhando para as questões da natureza: como as pessoas agem e pensam sobre o meio ambiente?”.
Levantamento do mesmo apontou que 87% dos brasileiros e 87% dos poloneses se declaram cristãos. A partir desses dados, a pergunta dos pesquisadores é se a religião influenciaria a visão de mundo e o comportamento dos indivíduos, e se afetaria a maneira como entendemos a natureza e agimos na ecologia.
– As pessoas são formadas por diversos aspectos, tais como visão de mundo, discurso, comportamento, crenças e discursos. O objetivo da pesquisa é ver como esses aspectos se relacionam e como afetam o mundo material, pela ação das pessoas sobre o mundo – explicou Pena Firme.
Ao abordar a visão dos brasileiros sobre as mudanças climáticas, o professor exibiu a imagem de um indiozinho acariciando uma capivara, e perguntou à plateia de estudantes da PUC viam-se iguais a ele. Diante de repostas negativas, Pena Firme observou que a única diferença é que o índio foi criado num contexto de relação mais próxima com a natureza: “A questão é até que ponto essa cosmovisão está ligada a uma religião”.
Ao mesmo tempo, segundo o professor, há um mito de que povos nativos, religiões antigas, mesmo as orientais, são mais propensas a atitudes e pensamentos favoráveis ao meio ambiente. “Será? Várias pesquisas estão dizendo que não é bem assim”, disse Firme, citando o livro When God isn't green: A world-wide journey to places where religious practice and environmentalism collide (“Quando Deus não é verde: Uma viagem ao redor do mundo para lugares em que praticas religiosas e ambientalismo colidem”, em tradução livre), em que o autor, o professor Jay Wexler, da Universidade de Boston, reúne relatos relativizando a suposta harmonia entre várias religiões com a natureza. E lembrou ainda que, entre muitos cristãos, é comum o pensamento de que a Terra não vai acabar e que, se chegar a esse ponto, Deus iria intervir.
– No final das contas, o que os pesquisadores querem saber é o que os brasileiros pensam. A crença em determinada religião tornaria as pessoas mais ou menos propensas em agir em prol da conservação ambiental, a aceitar que as mudanças ambientais sejam consequência de ação humana? Esta é uma das hipóteses a serem testadas nesse trabalho.