Padre Josafá: “Precisamos ver a espiritualidade nos biomas”
12/06/2017 12:45
Giulia Vertematti e Natália Oliveira

Para o reitor da Universidade, valores espirituais dos biomas devem se refletir na sociedade e irrigar práticas sustentáveis regulares. Iniciativas como o plantio de 23 árvores no campus reforçam Agenda Socioambiental da PUC-Rio, oxigenada por debates e oficinas da XXIII Semana do Meio Ambiente 

Tema da Campanha da Fraternidade deste ano, a preservação dos biomas brasileirios foi destacada pelo reitor da PUC-Rio, padre Josafá Carlos de Siqueira, S.J., na palestra de encerramento da XXIII Semana do Meio Ambiente, sexta-feira passada. Para o especialista, autor de livros como Um olhar sobre a naturezaÉtica e meio ambiente, A flora do campus da PUC-Rio e Ética socioambiental, os seis biomas do país (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Campos Sulinos e Pantanal) reúnem valores espirituais "que devem se refletir na sociedade", inspirá-la. 

Padre Josafá. Foto: Matheus Aguiar

A espiritualidade irrigaria, ainda de acordo o reitor, uma capacidade de "enxergar, nas coisas pequenas, uma grandeza em potencial". Esta visão, “uma sabedoria de vida”, pode ser notada no cerrado brasileiro: o bioma produz uma pluralidade de grãos que tendem a reforçar a exportação brasileira. Estima-se um salto de 40% na área de cultivo de grãos, na próxima década.

– Pode ser que uma coisa bem pequena se torne uma coisa bem grande. Saber olhar a pequenez exterior é essencial! O cerrado tem essa característica – observou o reitor, no desfecho da série de oficinas e debates organizados, ao longo da semana, pelo Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente (Nima).

Padre Josafá também relembrou a encíclica do Papa Francisco Louvado sejas (Laudato si, em latim), apresentada em maio de 2015, para aproximar a fé cristã dos cuidados com a "casa comum", o meio ambiente. Espécie de embaixador no Brasil das questões socioambientais reunidas na encíclica, autor do livro Laudato Sí: um presente para o planeta (Editora PUC-Rio), ele propaga, com o suporte do Nima, o espírito integrador em torno de esforços interdisplinares comprometidos com a sustentabilidade – cristalizados na Agenda Socioambiental da Universidade, revista a cada ano. Aos estudantes e professores reunidos no auditório do RDC, padre Josafã ressaltou também a importância de as retóricas sustentáveis converterem-se em ações sistemáticas: 

– Às vezes ficamos no ideal, naquilo que desejamos fazer, e ignoramos o que podemos fazer. Normalmente, as nossas atitudes são pequenas, mas ficarão grandes no futuro. Não jogar o lixo no chão e usar produtos recicláveis são pequenos gestos, mas extremamente relevantes à preservação do meio ambiente – exemplifica biológo e ambientalista à frente da PUC-Rio,.

Íntimo dos temas e desafios ambientais, destacados nos mais de 50 artigos científicos e 13 livros publicados, o também fundador do Nima, em 1989, padre Josafá explicou peculiarodades e traços comuns dos seis biomas do país. Alinhado ao olhar do papa Francisco sobre a Amazônia, o reitor diz que a região apresenta "característica ambiental única, pois retrata a biodiversidade e a cultura sempre juntas”. Para ele, é preciso "saber lidar com as diferenças", como as identificadas nos biomas amazônico e da Mata Atlântica:

– Devemos crescer a partir das instabilidades. A Amazônia lida com uma pluralidade de línguas e espécies, e ela encara bem. É preciso crescer humanamente, no sentido de não afastar o diferente. Qual é a graça da vida se ela for monótona?.

O tema, cuja relevância se insere nos compromossos para o desenvolvimento sustentável, ganha mais visibilidade com a Campanha da Fraternidade Biomas brasileiros e defesa da vida, baseada no lema “cultivar e guardar a criação”(Genesis, 2.15). Padre Josafá lembra que "os biomas estão presentes nas nossas vidas, apesar da distância". Revelam-se decisivos não só à construção de um mundo mais sustentável, mas à própria sobrevivência do planeta:

– Eles (biomas) prestam serviços a nós. O que muitos politicos não veem é que destruir biomas é destruir a  sobrevivência, é alterar o clima, é mexer no potencial alimentício e medicinal. Eles são nossos patrimônios. Devemos estudá-los e preservá-los – conclama o reitor. 

A proposta de amadurecer o senso de preservação e de expandir as iniciativas sustentáveis integradas, a começar pela Agenda Socioambiental da Universidade, ecoou na programação da XXIII Semana de Meio Ambiente, organizada pelo Nima. Da série de palestras, oficinas e mutirões, fez parte o plantio de mudas para ampliar a cobertura vegetal e valorizar o ecossistema. Segundo Roosevelt Fideles, gerente dos projetos ambientais do Nima, há mais 110 espécies nativas e exóticas na flora da Universidade. O próprio reitor participou do reflorestamento de 23 árvores, de diferentes espécies, no bosque do campus. Ao plantar um ipê, numa área do bosque próxima ao anfiteatro Junito Brandão, ele homenageou a professora Ana Waleska Pollo Campos Mendonça, do Departamento de Educação, falecida recentemente.

– Vamos plantá-lo em homenagem à professora Ana Waleska. Ela era uma professora e uma pessoa brilhante.

Padre Josafá. Foto: Matheus Aguiar

Espaço acadêmico aberto a canteiros comunitários

O mutirão de replantio atraiu dezenas de alunos, adesão que anima o propósito de criar novos espaços de convivência por meio da agricultura e de estreitar a relação dos estudantes com os canteiros. Organizadas pelo coletivo Horta Nossa, em parceria com o Nima, as ações reuniram diversos alunos dos cursos de Geografia e Engenharia Ambiental, como Ana Rosman. Depois de esclarecer o conceito de agrofloresta e agroecologia, ela contou como o nasceu aquele grupo: 

– O Horta Nossa surgiu da nossa insatisfação perante o abandono de canteiros e praças da cidade do Rio. O movimento promove a revitalização e a recuperação dos solos degradados, para torná-los férteis e produtivos por meio do uso ecológico e sustentável.

Formado em Geografia pela PUC-Rio, João Pedro Menezes demonstrou o uso dos instrumentos de plantio. Também explicou, com a ajuda do ex-colega de curso Matheus Siniscalchi, as características básicas das mudas que seriam plantadas, como de boldo, alecrim, hortelã, couve e pimenta. Matheus reiterou a importância de canteiros comunitários no espaço acadêmico:

– O plantio que propomos aqui é biodiverso e nutritivo. Ao plantarmos espécies diversas num mesmo ambiente, podemos observar a interação das plantas. A agroecologia permite que todos os organismos tenham suas funções aproveitadas. Além disso, o mutirão agroflorestal é uma quebra de paradigma, pois o homem está manuseando a floresta de uma maneira consciente e ecológica – argumenta.

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