Cooperação é a chave para conflitos latino-americanos, ressaltam analistas
03/06/2017 12:32
Giulia Vertematti e Natália Oliveira

Para especialistas reunidos em debates organizados pelo IRI, amadurecimento da segurança depende de políticas públicas integradoras e combate sistemático ao crime organizado.

Castigada por turbulências econômicas e disputas locais, como o que corrompe a Venezuela de Nicolás Maduro, o continente sinaliza, por outro lado, esforços integradores capazes de construir novos horizontes. O diagnóstico, feito por analistas reunidos na palestra Integração Regional e Segurança na América Latina, organizada pelo Instituto de Relações Internacionais (IRI) da PUC-Rio, é acompanhado de um alerta: sem uma melhor cooperação entre os países do bloco, torna-se mais difícil a resolução de conflitos e o amadurecimento da segurança na região.

Para os especialistas, os governos devem repensar os posicionamentos sobre a relação de precariedades de segurança pública com escassez de recursos e desequilíbrios na distribuição de renda. Na opinião do professor de Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), Antonio Jorge Ramalho, uma melhor proteção no continente demanda, entre outros fatores, a consolidação de uma identidade política – a qual tem sido construída de forma gradual, segundo pesquisadores da área.

– Temos uma novidade nesta construção identitária. Os governos estão semeando uma integração entre os países da América Latina. Entretanto, é possível perceber também aumento dos conflitos por região, transferência internacional de armas e crises de representação – ressalvou o analista, aos estudantes e professores que lotavam o auditório do RDC, numa das mesas organizadas pelas coordenadoras do IRI, Claudia Fuentes e Andrea Ribeiro Hoffmmann.

Antonio Jorge Ramalho, especialista em Relações Internacionais. Foto: Matheus Aguiar

Ramalho acrescenta que o principal propulsor da violência nos territórios latino-americanos é o crime organizado. Diante de, segundo ele, uma escalada de riscos globais, a cooperação regional revela-se ainda mais importante:

– As ameaças globais vão crescer. A alternativa é cooperar entre si, aumentar a capacidade de dissuasão. As estruturas estão aí, mas tudo depende de como nossos líderes vão agir.

Miriam Saraiva e Andrea Ribeiro Hoffmmann. Foto: Isabella Lacerda

Para a também professora Miriam Saraiva, doutora em política da América Latina pela Universidade Complutense de Madrid, a alteridade continental aguçada com o muro proposto pelo presidente americano, Donald Trump, na fronteira com o México, é um reforço “da identidade latina”. Ela alerta, contudo, para o risco de interesses políticos prejudicarem os movimentos integradores na região:

− A alteridade é uma questão mais do que relevante agora, porque nós temos um muro sendo construído no México. A integração em curso foi cada vez mais interrompida por questões políticas.

Já para o professor da PUC-SP Paulo Pereira, especialista em política internacional, o crime organizado segue como um dos principais entraves à integração e à segurança na América Latina. Pois a região, observa ele, responde ainda por "grande participação no tráfico de drogas internacional", principalmente de cocaína. Pereira destaca que os crimes praticados nos países latinos, especialmente o Brasil, têm uma dinâmica e dimensão internacional:

– Se tomarmos como exemplo a ação recente de desmantelamento da Cracolândia, coordenada pelo prefeito de São Paulo, João Dória (PSDB), é possível observar a dinâmica internacional na lavagem de dinheiro e na compra de armamentos israelenses. O espaço das drogas é transnacional.

Ainda de acordo com o professor da PUC-SP, os dilemas associados ao crime apresentam dois focos: compreensão e controle:

– A definição do que é crime varia de acordo com o tempo e o espaço. Portanto, deve-se pensar que tipos de condutas são necessárias para combater as atividades criminosas. É preciso uma melhor compreensão dos processos e das estruturas do crime, como as máfias e as redes. Ademais, os governos necessitam rever as normas internacionais de proibição, além do uso da força na repressão a ações criminosas e da iniciativa privada na administração da segurança – propõe.

Também especialista em ciência política, o professor da USP Rafael Villa acredita que as forças estatais tenham um peso preponderante para a busca da "paz democrática": 

– Algumas condições favoreceram o surgimento deste núcleo de pensamento, o da paz democrática. As grandes guerras estatais na região latino-americana não foram tão grandes comparadas com as de outras regiões. Apesar de ser repleta de conflitos territoriais, estes não foram capazes de superar as disputas estatais.

Estas circunstâncias levaram, segundo o analista, à desvalorização de alguns sistemas de segurança:

– A minha teoria é que a maneira como a segurança opera na América Latina provoca tensões constantes em regiões militarizadas.

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